outubro 26, 2006

República e Saúde Mental

Arthur Bispo do Rosário

















Manto da apresentação... de Arthur Bispo do Rosário

Nota:
Sr. Presidente da República,

A Associação Chico Inácio, filiada à Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial, vem se manifestar por ocasião de mais duas mortes de usuários de saúde mental que cruzam o caminho da Reforma Psiquiátrica brasileira.

Infelizmente, fatos dessa natureza ocorrem na medida em que ainda convivemos com modelos obsoletos de atenção à saúde mental, representado pelo Hospital Psiquiátrico e seus ambulatórios de consulta.

Re-lendo a Declaração de Caracas, muito já foi feito no Brasil, muito ainda está por ser feito.

Junto com este importante documento a favor de legislações que afirmem o respeito aos direitos humanos e civis dos doentes mentais e que promovam a organização de serviços comunitários de saúde mental garantindo seu cumprimento, publico carta do Fórum Cearense de Saúde Mental, filiado da Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial e matéria publicada pelo jornal gaúcho Zero Hora: ambas abordam sobre a
morte de usuários de sáude mental. Recentemente, foi necesssário apelar para o Tribunal da Corte Internacional dos Estados Americanos em busca de justiça:o Brasil foi condenado pela morte de Damião Ximenes, ocorrida no estado do Ceará, depois da omissão das autoridades brasileiras.

Enquanto subsistir formas anacrônicas de cuidados em saúde mental, baseadas na remissão do sintoma do sujeito, no controle de sujeitos toleráveis para o convívio social, no mito de que o maior obstáculo para o tratamento dos usuários são seus familiares, sem que se dê conta de que ainda convivemos com uma profunda desigualdade de cuidados oferecida para os portadores de sofrimento mental num Estado historicamente omisso, aumenta a sobrevida dos arautos desse modelo, incapazes de assumir as responsabilidades por um outro tipo de funcionamento dos serviços de saúde mental, de caráter comunitário, como os mais de 900 Centros de Atenção Psicossocial em funcionamento no país, serviços que conjugam projetos terpêuticos com o exercício da liberdade e da cidadania.

Por outro lado, a criação de novos paradigmas em saúde mental não pode prescindir de profundas alterações no tipo de formação oferecida aos profissionais do setor, sob pena de que as ações de saúde mental tenham um caráter meramente técnico, sem os princípios éticos que dão sustentação à Reforma Psiquiátrica brasileira, reconhecida internacionalmente .

Esperamos que, num eventual segundo mandato de governo, hajam mais investimentos na expansão dos serviços substitutivos ao manicômio e na formação de profissionais comprometidos com o desafio civilizatório de fazer caber o louco na cultura dos nossos tempos. E que as mortes denunciadas pelos nossos companheiros não fiquem impunes.

Respeitosamente,

Aderildo Guimarães
Presidente da Associação Chico Inário


Declaração de Caracas

Documento que marca as reformas na atenção à saúde mental nas Américas

As organizações, associações, autoridades de saúde, profissionais de saúde mental, legisladores e juristas reunidos na Conferência Regional para a Reestruturação da Assistência Psiquiátrica dentro dos Sistemas Locais de Saúde,

VERIFICANDO,

1. Que a assistência psiquiátrica convencional não permite alcançar objetivos compatíveis com um atendimento comunitário, descentralizado, participativo, integral, contínuo e preventivo;
2. Que o hospital psiquiátrico, como única modalidade assistencial, impede alcançar os objetivos já mencionados ao:
a) isolar o doente do seu meio, gerando, dessa forma, maior incapacidade social;
b) criar condições desfavoráveis que põem em perigo os direitos humanos e civis do enfermo;
c) requerer a maior parte dos recursos humanos e financeiros destinados pelos países aos serviços de saúde mental; e
d) fornecer ensino insuficientemente vinculado com as necessidades de saúde mental das populações, dos serviços de saúde e outros setores.

CONSIDERANDO,

1. Que o Atendimento Primário de Saúde é a estratégia adotada pela Organização Mundial de Saúde e pela Organização Panamericana de Saúde e referendada pelos países membros para alcançar a meta de Saúde Para Todos, no ano 2000;
2. Que os Sistemas Locais de Saúde (SILOS) foram estabelecidos pelos países da região para facilitar o alcance dessa meta, pois oferecem melhores condições para desenvolver programas baseados nas necessidades da população de forma descentralizada, participativa e preventiva;
3. Que os programas de Saúde Mental e Psiquiatria devem adaptar-se aos princípios e orientações que fundamentam essas estratégias e os modelos de organização da assistência à saúde.

DECLARAM

1. Que a reestruturação da assistência psiquiátrica ligada ao Atendimento Primário da Saúde, no quadro dos Sistemas Locais de Saúde, permite a promoção de modelos alternativos, centrados na comunidade e dentro de suas redes sociais;
2. Que a reestruturação da assistência psiquiátrica na região implica em revisão crítica do papel hegemônico e centralizador do hospital psiquiátrico na prestação de serviços;
3. Que os recursos, cuidados e tratamentos dados devem:
a) salvaguardar, invariavelmente, a dignidade pessoal e os direitos humanos e civis;
b) estar baseados em critérios racionais e tecnicamente adequados;
c) propiciar a permanência do enfermo em seu meio comunitário;
4. Que as legislações dos países devem ajustar-se de modo que:
a) assegurem o respeito aos direitos humanos e civis dos doentes mentais;
b) promovam a organização de serviços comunitários de saúde mental que garantam seu cumprimento;
5. Que a capacitação dos recursos humanos em Saúde Mental e Psiquiatria deve fazer-se apontando para um modelo, cujo eixo passa pelo serviço de saúde comunitária e propicia a internação psiquiátrica nos hospitais gerais, de acordo com os princípios que regem e fundamentam essa reestruturação;
6. Que as organizações, associações e demais participantes desta Conferência se comprometam solidariamente a advogar e desenvolver, em seus países, programas que promovam a Reestruturação da Assistência Psiquiátrica e a vigilância e defesa dos direitos humanos dos doentes mentais, de acordo com as legislações nacionais e respectivos compromissos internacionais.

Para o que
SOLICITAM

Aos Ministérios da Saúde e da Justiça, aos Parlamentos, aos Sistemas de Seguridade Social e outros prestadores de serviços, organizações profissionais, associações de usuários, universidades e outros centros de capacitação e aos meios de comunicação que apóiem a Reestruturação da Assistência Psiquiátrica, assegurando, assim, o êxito no seu desenvolvimento para o benefício das populações da região.

APROVADA POR ACLAMAÇÃO PELA CONFERÊNCIA, EM SUA ÚLTIMA SESSÃO DE TRABALHO NO DIA 14 DE NOVEMBRO DE 1990.

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CARTA CIRCULAR AOS NÚCLEOS DA REDE INTERNÚCLEOS DA LUTA ANTIMANICOMIAL E ÀS ENTIDADES DE DEFESA DOS DIREITOS HUMANOS NO BRASIL


O Fórum Cearense da Luta Antimanicomial, núcleo da Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial entidade do movimento social que reúne pessoas e instituições que atuam na defesa dos direitos humanos, no combate a violência, discriminação e segregação social das pessoas com transtornos mentais, vem através deste apresentar denúncia de morte da Srª Francisca Sousa Torquato, de 34 anos, ocorrida no dia sete (07) deste no Hospital de Saúde Mental de Messejana (HSMM), onde segundo depoimento do marido em programa de Rádio da emissora Verdes Mares, do locutor Carlos Augusto, transmitido no dia quatorze (14) deste, há suspeita de maus tratos cometidos contra a mesma. No momento do velório, familiares identificaram muitas manchas no seu corpo, em especial na área do pescoço, que fizeram a família suspeitar que ela tivesse sido vítima de violência. A partir da verificação destes, foi solicitado ao Instituto Médico Legal (IML) a realização de um exame cadavérico para fins de conhecimento da causa da morte, mesmo com a existência do atestado de óbito emitido pelo hospital de Saúde Mental de Messejana afirmando o óbito da Sra. Francisca como em conseqüência de morte natural por parada cardíaca.

O presente relato nos foi apresentado na última reunião de Sábado, dia vinte e um (21) do Fórum Cearense da Luta Antimanicomial por uma integrante do mesmo que ouviu o programa na referida data, e diante da gravidade da denúncia, o Fórum se dirige neste momento á todas as entidades que defendem os direitos humanos em nosso país, em especial aos núcleos da Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial, solicitando apoio para que seja no Brasil e no Ceará em particular, uma frente de entidades de defesa de direitos humanos para acompanhamento das ações de apuração desta denúncia, e para dar apoio aos familiares da Sra. Francisca, de modo que também se organizem ações que impeçam que fique impune mais este exemplo da barbárie promovida no cotidiano do inferno dos manicômios brasileiros.

E o fato ganha maior gravidade em acontecendo no Ceará e no nosso Brasil, que recentemente foi condenado a pagar indenização aos familiares e responsabilizado pela Corte Internacional de Direitos Humanos, pela morte de Damião Ximenes Lopes, também morto por violência em um outro hospício brasileiro, na Casa de Repouso Guararapes, na cidade de Sobral, no interior do Ceará, em 4 de outubro (quase no mesmo dia da Sra. Francisca) de 1999, o que foi divulgado ampla e nacionalmente em toda a imprensa brasileira.

Neste caso, o Estado Brasileiro foi condenado por não garantir a proteção á vida do usuário quando o mesmo estava sob cuidados de Sistema Único de Saúde-SUS, visto que a instituição era credenciada ao SUS. Neste caso, o hospital onde a Sra. Francisca foi encontrada morta é um hospital público estadual.E esta ocorrência, em se confirmando que se constitui de mais um exemplo da violência do hospício, explicita o desprezo que donos e apoiadores desta cultura manicomial dedicam á sociedade brasileira, em especial ás pessoas que para estes são levadas supostamente para serem tratadas, e acreditamos que devemos organizar uma frente nacional em defesa do fim desta barbárie que se repete todo dia nestes hospícios e manicômios brasileiros, e que sejam apontados os responsáveis por mais este crime.

Atenciosamente,

Fórum Cearense da Luta Antimanicomial
Contatos: antimanicomial.ceara@bol.com.br
Recados: Conselho Regional de Serviço Social – CRESS – 85-3281-0426


Fortaleza, 24 de Outubro de 2006

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Violência
Paciente de clínica morre durante briga
HECTOR WERLANG/Agência RBS

As circunstâncias da morte de um paciente, dentro da Clínica Nossa Senhora de Fátima, serão investigadas pela polícia de Cachoeirinha.

Na tarde de sábado, João Umberto Paganela Pires, 51 anos, morreu após brigar com uma atendente. Ele teria sido agredido a vassouradas. O local é particular e atende pessoas com problemas mentais.

Eram 14h30min quando gritos chamaram a atenção de vizinhos da clínica, na Rua Upamoroti, bairro Princesa Isabel. Morador da casa ao lado da clínica, Velci Souza da Rocha, 45 anos, acompanhou a confusão.

- Estava tomando chimarrão, com a minha mulher, e ouvi uma gritaria. Do pátio, vimos a funcionária batendo no paciente com a vassoura. Ela deu com vontade. Foram mais de 10 golpes - relata.

Funcionário público, o vizinho conta que a mulher desferiu os golpes mesmo com a vítima no chão. O morador chamou a Brigada Militar. Quando os PMs chegaram, João Umberto já tinha sido levado ao Hospital Padre Jeremias. Ele deu entrada, sem vida, às 14h56min. João Umberto, natural de Vacaria, onde mora sua família, sofria de esquizofrenia crônica.

Funcionária disse que agiu para se defender

A BM registrou a ocorrência como maus-tratos na Delegacia de Pronto Atendimento (DPPA) de Gravataí. Em depoimento, Márcia Rejane Costa dos Santos, 33 anos, informou ter reagido a uma tentativa de agressão por parte do paciente, que teria tentado acertá-la com uma cadeira. -

Precisamos saber a causa da morte. A vítima pode ter batido a cabeça no chão. A funcionária confirma a discussão e diz que as vassouradas foram para se defender - explica o delegado Cleiton Silvestre.

O corpo foi levado ao Departamento Médico Legal, em Porto Alegre. O caso ficará com a 1ª DP. (hector.werlang@diariogaucho.com.br)

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Nota: Segundo a Assessoria Técnica em Saúde Mental do Ministério da Saúde, a notícia veiculada no jornal Zero Hora sobre a morte de um paciente em uma clínica privada em Cachoerinha/RS é precupante porque a clínica/abrigo não é conveniada ao SUS e funcionava há poucos meses sem alvará de funcionamento da vigilância sanitária municipal - que negou o pedido. A clínica teria entrado com processo no MP para conseguir o alvará.

Segundo a coordenadora da SES/RS, foi realizada uma vistoria por técnicos da saúde mental do estado e da vigilância sanitária local. Várias irregularidades foram constatadas (mais pessoas do que espaço físico, ausência de profissionais, entre outras).

Em seguida houve uma vistoria da vigilância sanitária estadual e uma reunião com o Ministério Público.

Após a vistoria da VISA estadual será feita uma avaliação sobre a interdição da clínica.

Segundo a Assessoria Técnica em Saúde Mental do Ministério da Saúde, este fato nos alerta para a grave situação de abrigos que vão sendo criados de forma irregular, sem condições mínimas de cuidado, em que ocorrem violações de direitos. É necessário um levantamento destas instuições para que possamos conhecê-las e monitará-las de alguma forma.

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Nota: É pouco! É preciso radicalizar a mudança do modelo de tratamento em saúde mental. Por mais recursos financeiros! Por mais e melhores cursos de formação de técnicos em saúde mental.

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