março 09, 2007

Mulheres amazonenses no Dia Internacional da Mulher

Foto: Rogelio Casado - Dia Internacional da Mulher-2007, Manaus/AM












Mulheres amazonenses organizadas; de blusa amarela, Socorro Papoula, do Conselho Municipal dos Direitos da Mulher

Para o relicários dos movimentos sociais

Querido diário,

Durante as comemorações do Dia Internacional da Mulher, o filósofo popular Zefofinho de Ogum sapecou contra um desanimado militante: "Se mulher fosse soldado e jaraqui munição, Manaus brigaria com qualquer nação".

A frase não traduz o perfil da sábia criatura, contrário ao espírito belicista contemporâneo. Retirada do contexto em que foi dita, nem de longe lembra a aversão do nosso personagem aos que fizeram do "politicamente correto" seu modus vivendi.

O interlocutor de Zefofinho criticava a baixa resposta dos movimentos sociais, à exceção do MST, aos dilemas da democracia representativa: à sua sombra se instalou no Brasil uma excessiva concentração de renda e a exclusão sistemática da maioria da população dos benefícios internos de crescimento do Produto Interno Bruto. Taí Manaus - no ranking da economia brasileira - a contribuir com um expressivo quarto lugar no PIB, graças ao seu Parque Industrial, incapaz, entretanto, de reduzir o estado de pobreza permanente da sua periferia urbana, que é de doer o coração até de ateu de carteirinha, argumentou o revoltado militante.

Para Zefofinho, é aí que entram as mulheres. Citando uma psicanalista francesa, nosso sábio constrói um raciocínio instigante: primeiro, ele afirma, sem medo de errar, que há, em escala planetária, um movimento de desidentificação da mulher do conjunto das projeções com as quais o homem constituiu a identidade feminina. Ora, essa recusa da identidade social adquirida através de uma revolta contra as instituições e o universo simbólico que as legitima, se indica que a origem das prescrições machistas ainda não tem data para acabar, demonstram que o discurso da opressão já não tem a mesma força. E uma vez que o capitalismo ainda se rende à microcomunidade, lugar onde se reproduz a força de trabalho, pergunta Zefofinho: Ora, ora! meu prezado, quem garante essa reprodução? Tá na cara, não? Mulheres do meu Brasil, uni-vos! Sempre e cada vez mais, exorta Zefofinho. Para ele, o mesmo capitalismo que ajudou a desarticular a família, sem escrúpulos - taí os emigrantes como testemunha -, ao mesmo tempo que preservou-a taticamente, jamais pensou que a diferença entre homem-mulher, mesmo mantida, se inscreveria num conjunto de reivindicações pela igualdade e iria muito além das redução das diferenças ligadas ao estatuto social.

Deu-se, então, a melódia. Para Zefofinho, os discursos que escondem a relação contraditória entre homens e mulheres, na tentativa de presevar a hierarquia entre seus termos, bem como os efeitos seculares de dominação e opressão de um termo sobre o outro, já não conseguem se sustentar, resultando no aumento da violência contra o ser e o corpo feminino, num sinal de impotência da munutenção dos velhos discursos e práticas. Eis que a mesma força que levaram as mulheres a romper com seu fechamento, obrigando-as a sair dos seus lares, agora toma conta das ruas para criar um lugar coletivo da existência feminina na luta contra a ordem masculina estabelecida. A progressiva politização das suas demandas evoluíram para a luta aberta contra o facismo, contra a proibição do aborto, contra o estupro etc.

Ao surgir da sombra secular como nova força social, o movimento social feminino a cada dia consolida-se como composição específica do avanço da história. Se foram capazes de descontruir um discurso escondido na lei social, explodindo suas instituições e sua prática, por tudo isso, para Zefofinho de Ogum, a nossa salvação é o feminismo, enquanto movimento intelectual, e o movimento de mulheres, enquanto movimento de base. Juntos eles serão capazes de combater a caretice institucionalizada e a resignação bovina nossa de cada dia, mistura que ajudou a conter os movimentos sociais no primeiro mandato do companheiro presidente. Dá-lhe, Fofinho!

PS.: As idéias de Zefofinho são tributárias da obra de Marie-Claire Booons sobre a diferença sexual, publicada pela Relume-Dumará.Posted by Picasa

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