abril 01, 2007

Rede de Amizade & Solidariedade comemora 10 anos de contrução da cidadania de soropositivos

Foto: Rogelio Casado - Parada do Orgulho Louco, Manaus-AM, 2004
A Rede de Amizade & Solidariedade às Pessoas com HIV/Aids - ong que atua no campo da defesa dos direitos de cidadania dos soropositivos do estado do Amazonas - está completando 10 anos de existência jurídica. Em nome da sua presidente, a guerreira Laurinha de Souza Brelaz (na foto ao lado participando da I Parada do Orgulho Louco em parceria com a Associação Chico Inácio - ong que atua no campo dos direitos civis e políticos dos portadores de transtorno mental), saúdo todos os companheiros que fizeram da primeira ong de usuários soropositivos dos serviços públicos de saúde um exemplo de como abrir espaços para novos atores sociais na luta pela cidadania plena.

Lembro-me de ter sido censurado por "companheiros" da área de Saúde por ter estado à frente da iniciativa de fundar uma ong para soropositivos. Argumentei, em vão, que a ong deveria se sustentar na parceria entre profissionais de saúde e usuários, para que em seguida, no processo de construção da cidadania, esses últimos assumissem paulatinamente sua condição de sujeitos de sua própria história. Os "companheiros" passaram, e, sem nenhum motivo de orgulho, eu "passarinho".

O que a censura escondia nada mais era do que a proverbial acomodação no enfrentamento dos conflitos, que, quase sempre, costumam deixar um rastro de intolerância, modificável se persistirmos no diálogo por uma outra coexistência entre os diversos atores da cena política. Foi o que fez a Rede de Amizade & Solidariedade. Jamais perdeu a autonomia, e com muita dignidade tornou-se parceira de importantes iniciativas no âmbito da relação entre serviço público e seus usuários. Com exemplos como esse o SUS sai fortalecido e agradece.

Em verdade, naquele período, não fiquei só. Alguns nomes de peso que se notabilizaram no cenário político na defesa da cidadania deram o apoio que hora exigia, entre eles o jornalista Mario Adolfo, o ex-deputado estadual Lino Chíxaro, o atual presidente do IBAMA Marcus Barros, o atual Secretario Municipal de Saúde Cyrino Bessa e, sobretudo, o meu amigo Juacy Botelho, economista, que articulou o lugar onde até hoje está abrigada a Rede de Amizade & Solidariedade: o Conselho Regional de Economia, do qual havia sido presidente. Destaque-se também o apoio do atual deputado federal Francisco Praciano, então vereador à época, que requereu o espaço da Câmara dos Vereadores de Manaus para o ato de posse da primeira diretoria da Rede de Amizade & Solidariedade.

Wilza Villela, médica psiquiatra, doutora em Medicina Preventiva, pesquisadora do Instituto de Saúde/São Paulo e do NEPAIDS/USP, que já me deu a honra de ler algumas das minhas histórias, certamente vibraria com o relato pormenorizado de como uma ong composta por anônimos usuários dos serviços públicos de saúde colaborou para o processo de transformação das relações de poder e dominação que sabidamente estruturam a vulnerabilidade social e individual face à Aids na sociedade brasileira. Não faltará oportunidade.

Estávamos no finalzinho do mês de março de 1997 quando fundamos a Rede de Amizade & Solidariedade às Pessoas com HIV/Aids na Câmara Municipal de Manaus. Era uma manhã de sábado, dia de supermercado e de por em ordem o que deixamos de fazer em casa durante a semana. Os organizadores do evento não imaginavam que o pequeno plenário da Câmara dos Vereadores fosse tomada por tantos simpatizantes do nascente movimento social em defesa dos direitos de cidadania dos soropositivos do estado do Amazonas.

A surpreendente acolhida emocionou o pequeno grupo de cidadãs e cidadãos soropositivos. Assustados, só tomariam a iniciativa de usar a palavra, quando os convoquei, na condição de primeiro coordenador da ong, a se expressarem sem receio, posto que todos os convidados presentes estavam calejados na luta pelos direitos de cidadania.

Elias, primeiro presidente da Rede de Amizade & Solidariedade, naquela manhã colocaria em prática a lição de Betinho, patrono da ong Ação da Cidadania Contra a Miséria e Pela Vida, irmão do compositor Chico Mário e do cartunista Henfil - todos soropositivos: jamais aceitar a clandestinidade. Betinho referia-se à sua condição de militante contra a ditatura militar instalada no poder a partir de 1964. Elias reafirmaria o desejo de por fim à clandestinidade na luta aberta contra o preconceito, cinco meses antes do desaparecimento do saudoso Betinho, cuja bandeira a Rede de Amizade & Solidariedade sustenta até hoje: "A Aids não é mortal, mortal somos todos nós".

Na esteira aberta pelos precursores, viria Laurinha de Souza Brelaz e a história dos soropositivos no Amazonas ganharia novos contornos e um novo rumo. Posted by Picasa

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