maio 05, 2007

No fim da luz, um túnel

Charge do Glauco
muito que se instalou uma crise na esquerda, depois da queda do muro da vergonha em Berlim - expressão fartamente usada pela imprensa dos anos da guerra-fria que se estabeleceu por mais de três décadas na história da humanidade. Novas declarações, no dia-a-dia da política nacional, alimentam essa crise que se arrasta nas duas últimas décadas. Vi gente que construiu sua identidade política no campo da esquerda, negando-a na atualidade. Sinal dos tempos da lógica cínica: só não muda de idéia quem não as têm.
Justiça se faça ao companheiro presidente: ele nunca disse que era de esquerda. Lembro-me, quando fazia residência médica em psiquiatria na cidade de Diadema - o D do quadrilátero político mais quente do país no final dos anos 1970: santo André, são Bernardo, são Caetano e Diadema - de assistir o metalúrgico Luís Inácio da Silva declarar sua aversão aos estudantes e intelectuais que davam "picica" na cena política da época. Eram tempos da proto-história de um vigoroso movimento sindical que iria empoderar (de empowerment, conceito desconhecido à época) a classe trabalhadora como protagonista de uma história que lhe havia sido subtraída pelo regime militar nos anos 1960. Depois disso, Lula não seria mais o mesmo.
Neste novo cenário, emergiu um dos mais importantes partidos da história política do Brasil contemporâneo. O resto dos acontecimentos ainda está na memória dos brasileiros: as sucessivas derrotas do Partido dos Trabalhadores, sua persistência na luta pela adoção de uma alternativa política, até a chegada ao poder em 2003. As alianças políticas com partidos de centro-direita deixou de cabelos em pé os militantes históricos e o fato escancarou novas dimensões da crise de identidade da esquerda brasileira, inaugurada com pompa e circunstância por FHC, ao negar seu passado: "esqueçam o que escrevi", logo ele que transitou com desembaraço no campo agora renegado. Acabou fazendo escola.
Recomendo duas leituras que estão na ordem do dia para os que acompanham os dilemas da esquerda brasileira: a edição da Caros Amigos, número 121, de abril de 2007, na qual trinta e seis pensadores e militantes, destacados por área de atividade, respondem à pergunta: O QUE É SER DE ESQUERDA? e o artigo "Os amigos do rei, guardiões da ordem e os radicais", publicado na Revista Espaço Acadêmico, da USP - um tema que alguns insistem em colocá-lo fora da pauta. Para o autor do artigo, "a fetidez do cadáver do stalinismo ainda polui os ares da esquerda".
Ressalva: muitos intelectuais identificam na USP um espaço de acolhimento de teses da direita brasileira. Atire a primeira pedra quem pensar o contrário, ou conteste contra o farto material que dá sustentação à idéia de que a história vive se repetindo, como farsa ou tragédia.

Nenhum comentário: