julho 10, 2007

O humanismo careta da psiquiatria conservadora

Hospital Ulysses Pernambucano - Recife-PE

O pernambucano Nivaldo Lima, personagem que habita essas páginas - membro da Associação Chico Inácio, filiada à Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial -, esteve internado por 15 vezes em vários hospitais psiquiátricos de Recife, inclusive no Hospital Ulysses Pernambucano, também conhecido como Hospital da Tamarineira. Perdeu as contas de quantos eletrochoques foi submetido, inclusive no Hospital da Tamarineira.

Eis que a psiquiatria conservadora, pegando carona no movimento contrário à privatização do sítio da Tamarineira, e usando a "estratégia terrorista" do fantasma da desassistência, quer manter a história do Hospital da Tamarineira. Nada contra, se fosse para transformá-lo num Museu de Horrores.

Enquanto a psiquiatria conservadora quer preservar a história dessa instituição sinistra, de um lado, por outro os(as) companheiros(as) que trabalham por uma sociedade sem manicômios, militantes e não militantes, há mais de duas décadas, vêm tecendo uma outra história de cuidados aos portadores de sofrimento psíquico através dos CAPS, ainda, reconhecidamente, em números insuficientes para a mudança efetiva do modelo assistencial no Brasil.

Aqui, vale lembrar a advertência do filósofo Nietzsche para todos nós que trabalhamos por um novo processo civilizatório, sobretudo nos entrelaces entre a loucura e as cidades: "É preciso sair da história, para agir".

A psiquiatria conservadora pode continuar ignorando que ela é o resultado de um amplo processo histórico, que não diz respeito a uma essência da loucura, mas a sua progressiva dominação e integração à ordem da razão. Nós, não!

A psiquiatria conservadora pode continuar ignorarando o caminho histórico no qual ela tornou o louco doente mental. Nós, não!

A psiquiatria conservadora pode continuar ignorando o que há por trás do seu humanismo pretensamente terapêutico - mito pelo qual ela teria possibilitado o reconhecimento da loucura e tratada segundo suas verdades. Nós, não!

A psiquiatria conservadora pode continuar ignorando o movimento tagarela da alienação por ela promovido. Nós, não!

A psiquiatria conservadora pode continuar ignorando o humanismo anêmico que sustenta sua prática, jamais emancipador, tampouco defensor da dignidade humana, mas certamente cúmplice e causa da opressão. Nós, não!

Nossa devoção ética, que nos torna infinitamente responsáveis pelo outro, está para sempre subsidiada na radical irretidão que o outro nos apresenta. Para isso, somente nos abrindo ao outro, acolhendo-o em nossa terra e oferecendo-lhe o nosso solo, somos remetidos a uma responsabilidade ilimitada, que excede e precede a minha liberdade.

Familiares, usuários e técnicos em saúde mental é hora de manifestação!

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Agora leia o artigo publicado no site da Associação Brasileira de Psiquiatria:

05/07/2007
Pela preservação do Hospital da Tamarineira

Diretoria da ABP enviou ofício à Comissão de Meio Ambiente, Transporte e Trânsito da Câmara Municipal do Recife

A diretoria da Associação Brasileira de Psiquiatria enviou ontem (04/07) um ofício à Comissão de Meio Ambiente, Transporte e Trânsito da Câmara Municipal do Recife, para expressar sua posição em relação ao destino do Hospital Ulysses Pernambucano e da sua área verde, que segundo notícias da imprensa local, pode ser vendido à iniciativa privada. Conhecidos pela população como Sítio da Tamarineira, o hospital e sua área verde, de mais de 90 mil m2, são ícones históricos da capital pernambucana e da psiquiatria brasileira.

Em seu documento, a ABP ressalta a importância do hospital na rede de atendimento em saúde mental da cidade, como é expresso no trecho: “A instituição atende pacientes que exigem um regime atenção integral de baixíssima oferta na rede pública. Com a interrupção desses serviços, os pacientes ficarão privados de assistência adequada, e, em último estágio, podem acabar nas ruas como exemplos observados em outras cidades do país”.

O Hospital da Tamarineira funciona há 83 anos. Atualmente, atende cerca de 1,8 mil pacientes por mês. São 160 leitos utilizados em regime de rotatividade para atender os portadores de transtornos mentais. Num dos prédios do terreno, funciona o serviço de atendimento e apoio aos alcoólicos anônimos.

Além da representação oficial, a Associação firmou-se como importante personagem neste debate, através da mídia local. A ABP foi representada pelo seu vice-presidente, o recifense João Alberto Carvalho, que explica o posicionamento da entidade: “Trata-se de um patrimônio histórico do povo do Recife e nós defendemos que se faça um uso adequado deste patrimônio, que é importante para a população local e para a psiquiatria de todo o país”.

O assunto esteve hoje na pauta de discussões da Comissão, através de audiência pública, na qual outros grupos representantes da sociedade civil defenderam, apoiados pela ABP, a criação do Parque da Tamarineira na área verde do hospital, mantendo os serviços de saúde, conjugados com um espaço recreativo de interesse público.

Clique aqui e veja a íntegra do ofício enviado pela ABP

Fonte: ABP

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