setembro 11, 2007

Os galos vão ter que cantar mais cedo

Os galos vão ter que cantar mais cedo

Por Deocleciano Souza

O Senado acaba de aprovar projeto de lei que visa reduzir em 1 hora a diferença no fuso horário no Acre em relação a Brasília. Pelo projeto, o Acre e os municípios amazonenses de Atalaia do Norte, Benjamim Constant, Eurinepé, Envira e Ipixuna deixariam de ter fuso horário com menos de duas horas em relação ao Distrito Federal. O autor do projeto, o senador Tião Viana (PT-AC), tinha apresentado duas proposições visando essa mudança. A primeira proposta era o Projeto de Lei n. 436/06, que convocava um plebiscito para que o povo opinasse sobre a mudança de fuso horário nos Estados do Acre e do Amazonas, até ai tudo bem. A outra proposição foi o projeto de Lei do Senado n. 1140/06 que altera o inciso “c”e revoga o “d” do artigo 2o do Decreto Lei n. 2.784, de 18 de junho de 1913. Esta, por ser mais fácil e que pega de surpresa os amazônidas, já foi aprovada e baixou para a Câmara Federal, diretamente para a Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática, o qual aguarda parecer.

O decreto n. 2.784, de 18 de junho de 1913, sancionado pelo então presidente Hermes da Fonseca, estabeleceu a hora legal no Brasil, dividindo-a em quatro fusos horários, cumprindo assim uma convenção internacional no qual o Brasil é signatário.

É preciso que se entenda que a hora oficial do fuso é diferente da hora local verdadeira, para cada fuso temos 15 graus, que é igual a 1 hora, não importando para o fuso se você está entre 1 grau e 15 graus, estando neste fuso todos terão a mesma hora, já que o quadrante solar terá sua sombra em diferentes posições em um mesmo fuso. O movimento do Sol não é uniforme no céu durante o ano, isso pode causar pequenas variações nas horas marcadas pelo quadrante solar. Para corrigir essa variação, foi instituído o tempo médio, que serve para medida precisa de tempo. A hora legal média local conta-se hoje de 0h. a 24 hs. A partir de meia noite. Inicialmente, cada nação tinha a sua hora, que era a hora de seu meridiano principal, quando se tratava de relações entre dois países tanto comerciais quanto sociais a confusão por causa dos horários diferentes eram complicados exigindo cálculos complicados. Para solucionar este problema adotou-se o “convênio internacional dos fusos horários”.

Longe de ser de interesse da população a mudança do fuso horário brasileiro, o Projeto de Lei aprovado no Senado vem atender aos proprietários das empresas de televisão, especialmente, à Rede Amazônica de Televisão. É que a partir de 9 de janeiro de 2008, as emissoras de televisão localizadas na Amazônia vão ter que cumprir com a Portaria n. 1.220, de 11 de julho do corrente ano, do Ministério da Justiça, que trata da classificação e faixas de horário de exibição de seus programas. A Portaria estabelece em seu parágrafo único do artigo 19 a exigência de que a programação obedeça aos horários estipulados, inclusive em localidades cujo fuso horário difere do oficial de Brasília. É ai que o bicho pega.

Acostumados com o superfaturamento e com o lucro fácil, as exigências da Portaria estão tirando o sono dos sócios da Rede Amazônica de Televisão, que só com o fato de pensarem em contratar pessoal técnico e equipamentos para realizar as gravações dos programas para serem inseridos nos horários estipulados, viram seus sonhos se transformarem em verdadeiros pesadelos. No caso do Amazonas, Rondônia e Rio Branco, a grade de programação da Rede Globo estaria defasada em apenas uma hora, e bastaria mexer com o horário do “Bom Dia Amazônia”, para que a programação enlatada da Rede Globo chegasse, direta e dentro dos horários estipulados, nos lares de seus telespectadores.

Mas no Acre a coisa é diferente, principalmente quando o sul maravilha fica sob o horário de verão. A programação da Rede Globo fica defasada em 3 horas o que obrigaria, além de contratar pessoal e equipamentos para gravar a programação da Vênus Platinada, teria que preencher as 3 horas de diferença do fuso com programação local o que iria ferir os termos do contrato com a Globo, que proíbe a inserção de programas locais, exceção feita ao jornalismo.

Assim é que com a mudança no fuso horário, além de isentar os “pobres” empresários de comunicação desses altos investimentos, as emissoras irão aumentar ainda mais o seu faturamento preenchendo o horário com mais comerciais.

Não satisfeitos com o projeto de lei aprovado no Senado, os parlamentares amazonenses resolveram dar uma mãozinha espichando o horário do Amazonas para ficar igual ao de Brasília. É como quer a deputada federal Rebecca Garcia (PP-AM), advogando em causa própria, ou melhor, em defesa de sua TV Rio Negro, ela garante que a “unificação dos horários da região norte seria importantíssimo. Isso já é voto certo. Agora se apresenta ou não substitutivo para a questão da unificação com o horário de Brasília, a gente vai ainda debater”, sintetizou. Assim, para atender a interesses pessoais vamos revogar, de uma só vez, os estudos milenares realizados por Galileu, Sir Isaac Newton e o relojoeiro britânico John Harrison, que ganhou o prêmio de vinte mil libras esterlinas ao construir um relógio que tinha uma precisão de um segundo num mês, acertando o seu relógio na cidade de Greenwich. Quem não vai gostar muito são os galos acostumados a cantarem às 5 da matina.

* O autor é jornalista e professor aposentado do Curso de Comunicação Social da Universidade Federal do Amazonas; por duas vezes foi presidente do Sindicato dos Jornalistas do Amazonas.

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