outubro 10, 2007

Retrocesso

Técnicos, Familiares e Usuários de Saúde Mental, 4/11/2003 - Manaus-Amazonas

No dia 4 de novembro de 2003 foi aprovada a Política de Saúde Mental do Estado do Amazonas. A maioria dos que aparecem nesse registro fotográfico são companheiros da Associação Chico Inácio e do Hospital Psiquiátrico Eduardo Ribeiro.

Divórcio

Um fato curioso e intrigante acontece na questão controle social das Políticas Públicas no Amazonas. O que é deliberado e aprovado nas conferências de saúde e mesmo nos conselhos de saúde deixam de ser defendidos por quem os aprovou, como se formuladores, planejadores e sociedade civil organizada não se entendessem quanto ao domínio público de suas decisões. Um verdadeiro divórcio. O caso da saúde mental é exemplar. A lógica seria estar alerta e defender o que foi aprovado, na medida em as propostas deixam de ser do gestor de saúde e passam a ser de interesse público.

Nas duas conferências de saúde, estadual e municipal, realizadas em 2003, na cidade de Manaus, lá estava a Associação Chico Inácio - ong de defesa dos direitos civis e políticos dos portadores de transtorno mental, que se filiou à Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial em 2004. Pois bem! Ela defendeu e conseguiu aprovar as propostas abaixo discriminadas.

Ora, cabe ao gestor de saúde trabalhar pela implantação e implementação dos itens acordados coletivamente. O problema é que no caso da saúde mental o acompanhamento das medidas cabíveis é sofrível e sujeito a equívocos, principalmente quando reformistas de araque, movidos pelo sentimento da paralização, colocam obstáculos para o desenvolvimento da reforma psiquiátrica, confundindo os atores sociais envolvidos com o processo de controle social. Pior!, cada dia se aperfeiçoam em confundir a opinião pública da cidade de Manaus.

O recurso utilizado para tanto é a (des)informação. Informação comprometida com nada, nada porquê não têm, nem nunca tiveram, proposta alguma a apresentar para a sociedade amazonense. Curiosamente, a maioria deles vem de fora do estado. Não tem amor à terra. Há exceções, honrosas, que trabalham pelo engrandecimento do Amazonas, em diversos escalões da administração pública.

Os que se valem do clima de apatia e indiferença que reinou no Amazonas no setor saúde mental dos anos 1990, para o qual eles mesmos contribuíram, e que deixou como efeito colateral uma redução drástica no campo da opinião pública, desconectada dos avanços obtidos nos anos 1980, a eles a minha moção de repúdio.

Certa vez, numa reunião do Conselho Comunitário do Sistema Carcarário, onde tinha assento como diretor do Hospital de Custódia de Manaus, e que era presidida pelo atual Secretário de Justiça e Cidadania do Estado do Amazonas, Lelio Lauria, ouvimos desse eminente jurista uma dura crítica a servidores descomprometidos com a causa pública: "Esse lixo humano não pode continuar fazendo de conta que servem aos interesses da sociedade". Faço minha as suas palavras.

Retrocesso

Pasmem! Na última Conferência Estadual de Saúde foi aprovada uma moção de repúdio à Lei de Saúde Mental 191/2007, votada no último dia 4 de outubro de 2007 pela Assembléia Legislativa do Estado do Amazonas. Um doce de cupuaçu japonês para quem descobrir os autores da façanha. Dica: trata-se de servidores com cargos na administração pública. Resta saber a que interesses eles servem. Porque, anonimamente, resolveram contrariar uma decisão de governo? Ao certo, mesmo, nenhum deles deu qualquer contribuição no plano das idéias que resultaram nas conquistas recentes do setor saúde mental. Pior!, sem memória, "esqueceram", que antes de ser Lei o Projeto foi discutido como o extinto Fórum de Entidades de Saúde Mental e com a Comissão Estadual de Reforma Psiquiátrica, estando contemplada a escuta da sociedade civil. Tanto assim, que mesmo abandonando o barco (que a Associação Chico Inácio jamais abandonou), alguns deles tentaram tirar proveito da aprovação da Lei de Saúde Mental do Estado do Amazonas num jornal local. Tia Pátria diria que mais difícil que cutucar a onça é meter o dedo no c... dela. Sorry!!!

O bicho vai pegar!

A luta continua!

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III CONFERÊNCIA MUNICIPAL DE SAÚDE – Manaus /2003

Propostas para a área de Saúde Mental

Modelo de atenção à Saúde Mental

1. Municipalizar e distritalizar as ações de saúde;
2. Criar o Programa Municipal de Saúde Mental;
3. Criar a Comissão Municipal de Reforma Psiquiátrica;
4. Criar a Rede Municipal de Atenção Diária à Saúde Mental;
5. Implantar Projeto de Atenção Básica em Saúde Mental no PSF;
6. Recensear a população acometida por transtornos de saúde mental nas áreas adscritas ao Programa Saúde da Família:
- Identificação das demandas
- Verificação das necessidades
7. Estabelecer serviços de referência e contra-referência de acordo com os níveis de complexidade da demanda;
8. Capacitar as equipes do Programa Saúde da Família para lidar com pessoas com transtorno mental, com enfoque sobre as famílias e cuidadores;
9. Garantir verbas no orçamento público para a implantação do Programa Municipal de Saúde Mental;
10. Implantar Rede de Atenção Diária à Saúde Mental de Crianças e Adolescentes;
11. Oferecer assistência em Centro de Atenção Psicossocial para usuários de álcool e outras drogas;
12. Capacitar os profissionais da Rede de Municipal de Saúde para atenção aos portadores de transtorno mental sob o paradigma antimanicomial.

Recursos Humanos

1. Levantar o número adequado de profissionais para constituir equipes multiprofissionais na Rede Municipal de Atenção à Saúde Mental
2. Suprir, em número adequado, equipes multiprofissionais para atuar no Programa Saúde da Família;
3. Contratar psiquiatras, psicólogos, assistentes sociais, enfermeiros, terapeutas ocupacionais e outras categorias para as necessidades da Rede Municipal de Atenção Diária à Saúde Menta;
4. Garantir, no orçamento público, verbas para a locação de recursos humanos e realizar concurso público;
5. Garantir, no orçamento público, verbas para a capacitação de recursos humanos;
6. Definir temáticas e cronograma de capacitação de recursos humanos no campo da atenção psicossocial para adultos, crianças e adolescentes, idosos, usuários de álcool e drogas, através de instrumentos que permitam a compreensão das redes sociais, do paradigma antimanicomial, da identificação, acolhimento, atendimento e encaminhamentos que envolvam situações de saúde mental;
7. Treinar em Saúde Mental as equipes do Programa Saúde da Família;
8. Criar programa permanente de formação de multiplicadores que atuem nas unidades de saúde, visando garantir o trabalho em rede entre os programas de saúde mental do Estado e do Município;
9. Garantir capacitação dos profissionais da área de educação para introduzir no ensino fundamental e médio temas transversais ligados à Saúde Mental, tais como violência, dependências químicas, psicoses na infância e outras.

Financiamento
1. Elaborar proposta orçamentária para a criação da Rede Municipal de Atenção Diária à Saúde Mental em seus diversos níveis

Controle Social

1. Nomear a Comissão Municipal de Reforma Psiquiátrica, respeitada a paridade de seus membros, para tratar de questões relacionadas ao tema, definindo seus membros através de portaria: representantes das Organizações não Governamentais de Saúde Mental, do campo dos Direitos Humanos, das Instituições Científicas, das Entidades de Classe, dos Trabalhadores de Saúde Mental, dos Gestores, dos Familiares e Usuários de Saúde Mental;
2. Criar Grupos de Cidadania em cada Unidade de Saúde para atuar junto aos Conselhos Comunitários, devendo ser aberto a usuários, familiares, técnicos e comunidade em geral;
3. Publicar o Plano Quadrianual de Saúde Mental do Município de modo a viabilizar o Controle Social, tendo como referência o que está contido nas decisões da III Conferência Nacional de Saúde Mental.

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IV CONFERÊNCIA ESTADUAL DE SAÚDE MENTAL – Amazonas / 2003

Propostas para a Saúde Mental

Construção da eqüidade

1. Construir a eqüidade na área da saúde mental, investindo na oferta de serviços para grupos populacionais vulneráveis com acesso e utilização insuficientes, como Centros de Reabilitação Psicossocial, Centros de Atenção Psicossocial para Infância e Adolescência, para usuários de álcool e outras drogas, para vítimas da violência, para transtornos mentais severos e persistentes, de modo a efetivar o acesso universal às ações preventivas e curativas com qualidade, humanização e resolutividade, bem como a redução das desigualdades.

Adequação da oferta de serviços de saúde às necessidades e prioridades da população

2. Mapear as necessidades e prioridades de saúde mental da população, de acordo com as realidades e peculiaridades regionais, através de critérios epidemiológicos e sociais, devidamente aprovadas pelos Conselhos de Saúde, para que a oferta de serviços, da qualidade e da resolutividade das ações de promoção, de proteção e recuperação da saúde traduzam os interesse dos Municípios.

Responsabilidades e atribuições na definição das necessidades da população por serviços do SUS

3. Oferecer serviços de saúde mental segundo metas pactuadas na Programação Pactuada Integrada – PPI, no Plano Diretor Regional – PDR e nos Planos Municipais de Saúde, regulando sua disponibilidade através de Centrais de Regulação, órgãos de Gestão, submetendo o controle de qualidade e de resultados ao contínuo acompanhamento dos respectivos Conselhos de Saúde.

Efetivação do caráter de Porta de Entrada dos Serviços de Atenção Básica à Saúde

4. Aumento da cobertura dos serviços em todos os níveis de complexidade, com ênfase especial na Atenção Básica, por intermédio do Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS) e do Programa de Saúde da Família (PSF), abrindo mais um espaço de mudança de modelo de atenção, que possibilita passar do atendimento de demanda para o atendimento por responsabilidade sanitária.

Planejamento da oferta e da remuneração dos serviços

5. Abrir discussão entre os gestores do SUS das três esferas, na Tripartite e Bipartites, e com os Conselhos de Saúde, visando a formulação de estratégias e mecanismos coerentes com a lógica do SUS sobre novas modalidades das transferências intergovernamentais de recursos financeiros para assegurar a implantação e implementação da rede de atenção diária à saúde mental.

Reorientação da política de recursos humanos do SUS

6. Implantar os princípios e diretrizes para a Norma Operacional Básica de Recursos Humanos para o SUS, aprovados na 11ª Conferência Nacional de Saúde e deliberados pelo Conselho Nacional de Saúde, visando superar os desafios da implementação de uma política de formação e qualificação de Recursos Humanos no campo da Saúde Mental, medida estratégica para o cumprimento da Lei 10.216.

Construção do SUS como Expressão da Saúde Pública e sua Responsabilidade Regulatória do SUS

7. Garantir mecanismo de Informação em Saúde Mental para a gestão, para a capacitação de recursos humanos e para o controle social.

Um comentário:

Anônimo disse...

Olá! Naum cheguei a ler td o q escreveu, mas gostei muito d ver q se trata da luta contra esse descaso c/a saúde mental q temos tido nos últimos tempos. Fui monitora numa exposição realizada pelo Ministério da Saúde, em 2005 - "Memória da Loucura". Apesar d ser pedagoga, naum tive como naum me sensibilizar c/a causa. Espero q essa data d hj se concretize d fato. Afinal, do q adiantam as leis se naum são postas em prática? Parabéns pelo teu trabalho.

Abraços,
Pati