maio 31, 2009

Os desafios da esquerda brasileira, visto da perspectiva eclesial

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Página 13 - junho 2009

Os desafios da esquerda brasileira, visto da perspectiva eclesial

Benedito Ferraro, assessor da Pastoral Operária de Campinas

Para compreender os desafios da esquerda, a partir da ótica eclesial no Brasil, queremos fazer um recuo no tempo.

Queremos apontar como aspectos importantes:

1. A importância do Concílio Vaticano II e seu contexto sócio-histórico (1962-1965): Superação do divórcio Igreja-Mundo.

A Gaudium et Spes (A Igreja no mundo de hoje) inicia um novo relacionamento com o mundo, com a pretensão de realizar um aggiornamento, a saber, proclamar a salvação de Deus numa linguagem que fosse entendida e significativa para os nossos contemporâneos. Há uma nova postura frente aos problemas humanos.

João XXXIII retoma a expressão usada pelo Concílio Vaticano II – os sinais dos tempos – para mostrar os três fenômenos que caracterizam a nossa época1:

a) A gradual ascensão econômico-social das classes trabalhadoras.
b) O ingresso da mulher na vida pública.
c) A evolução da sociedade humana para um padrão social e político completamente novo pelo processo de independência dos povos.

Seguindo na linha destes sinais dos tempos, é importante notarmos o que hoje se passa na América Latina e Caribe: os povos indígenas estão se tornando, na expressão de Boaventura Santos, no Fórum Social Mundial, Belém – 2009, os novos protagonistas da história. Milton Santos fala de um período democrático, na verdade, ele afirma que gostaria de falar de um período popular da história. Os pobres vão se tornando os protagonistas da mudança social. É um dado que não se pode deixar de notar, mesmo com suas ambigüidades.

2. A Teologia da Libertação.

A grande novidade da Igreja na América Latina e Caribe é a entrada dos cristãos e cristãs na luta política de libertação dos pobres e excluídos. Assim se expressa Gustavo Gutiérrez, um dos pais da Teologia da Libertação: “A inserção nas lutas populares pela libertação tem sido - e é - o início de um novo modo de viver, transmitir e celebrar a fé para muitos cristãos da América Latina. Provenham eles das próprias camadas populares ou de outros setores sociais, em ambos os casos observa-se - embora com rupturas e por caminhos diferentes - uma consciente e clara identificação com os interesses e combates dos oprimidos do continente. Esse é o fato maior da comunidade cristã da América Latina nos últimos anos. Esse fato tem sido e continua sendo a matriz do esforço de esclarecimento teológico que levou à teologia da libertação”2.

A temática da libertação, muito presente entre 1960 – 1989, torna-se ainda mais dramática com a entrada do neoliberalismo, com seu caráter de exclusão: “Na atual conjuntura, o fato maior é, sem dúvida, o cruel predomínio de uma férrea lógica da exclusão, o clima de indiferença anti-solidária que a sustenta e, em decorrência, o fato de que uma imensa «massa sobrante» de seres humanos descartáveis tenha passado a ser vista como lixo da história”3.

Tal consideração se alarga para outros lugares do mundo, como bem expressa o bispo Desmond Tutu: “A Teologia da libertação, mais que qualquer outro tipo de teologia, surge do crisol da angústia e dos sofrimentos humanos. Surge porque o povo grita:”Senhor, até quando? Oh! Deus, mas por quê?” Toda a teologia da libertação provém do esforço por dar sentido ao sofrimento humano quando aqueles que sofrem são vítimas de uma opressão e exploração organizadas”4.

Teologia Negra da Libertação nos USA, tal como é concebida por J.H.Cone, também é significativa para entendermos a dinâmica da libertação: “A resposta da Teologia Negra à questão da hermenêutica pode ser estabelecida de modo conciso: O princípio hermenêutico para uma exegese das Escrituras é a revelação de Deus em Cristo como o Libertador dos oprimidos da opressão social e para a luta política”5.

3. Comunidades Eclesiais de Base – Pastorais Sociais e CNBB.
Tripé que nos ajuda a compreender a ação da esquerda cristã. Sem este tripé, não se pode compreender as Campanhas da Fraternidade (sobretudo a partir de 1975), a participação no Grito dos Excluídos, na romaria dos trabalhadores/as, nas romarias da terra e das águas, a participação nos plebiscitos populares da dívida externa, da Vale do Rio Doce, o mutirão Nacional de superação da miséria e da fome, o Mutirão pela Amazônia (2003).

As CEBs são verdadeiras sementeiras de lideranças que se engajam nos movimentos populares, nos sindicatos, nos partidos, no MST, nas pastorais sociais ( pastoral operária, pastoral da criança, pastoral carcerária, pastoral da terra, pastoral dos pescadores...). O processo das Semanas Sociais Brasileiras foi um aprendizado significativo em termos de se pensar o projeto de um novo Brasil. A 2ª. Semana Social Brasileira nos legou frutos preciosos e que continuam a fazer frutificar a ação de construção de um país democrático. Ainda nos fica na memória a importância das quatro idéias-forças presentes no processo desta 2ª. Semana Social:

a) Radicalização da Democracia.
b) Construção Coletiva.
c) Cidadania Ativa.
d) Inversão de Prioridades.

Da 4ª. Semana Social Brasileira permanece o desafio da construção de um Brasil economicamente justo, politicamente democrático, socialmente solidário e ecologicamente sustentável.

Embora a CNBB tenha tido direções conservadoras, seus documentos continuam apontando para a construção do processo democrático. Os Documentos 80 e 82 da CNBB podem nos ajudar a perceber esta orientação.

4. O grande desafio para a esquerda brasileira: Fragmentação.

4.1. Fragmentação das centrais sindicais:

4.2. Fragmentação dos partidos políticos de esquerda.

5. Onde investir?

5.1. Processo de conscientização dos direitos dos cidadãos e cidadãs.

5.2. Politização: a política como instrumento de construção e organização da polis.

5.3. Busca de consenso frente às grandes prioridades da população, sobretudo a partir dos pobres e excluídos:

5.3.1. Luta contra o desemprego.

5.3.2. Luta pela Reforma Agrária e demarcação das terras dos indígenas e quilombolas.

5.3.3. Luta pelo aumento do salário mínimo.

5.3.4. Luta pela moradia.

5.3.5. Luta pela saúde.

5.3.6. Luta pela educação de qualidade.

5.4. Defesa da natureza (Luta ecológica).
Nova Iorque, Orbis Books, 1979, p. 163, citado por GUTIÉRREZ,G., op. cit., p. 15. Cf. também DUPUIS,J., Rumo a uma teologia cristã
do pluralismo religioso, Paulinas, São Paulo,1999, p. 36.

1 João XIII, Pacem in Terris, 40-42.
2 GUTIÉRREZ,G., A força histórica dos pobres, Vozes, Petrópolis, 1981, p. 245.
3 ASSMANN,H., Crítica à Lógica da Exclusão, São Paulo,Paulus, 1994, p.129.
4 TUTU,D., “The theology of liberation in Africa”, em African Theology en route, editado por Kofi Appian-Kubi e Sérgio Torres, Nova Iorque, Orbis Books, 1979, p. 163, citado por GUTIÉRREZ,G., op. cit., p. 15. Cf. também DUPUIS, J., Rumo a uma teologia cristã do pluralismo religioso, Paulinas, São Paulo,1999, p. 36.
5 CONE,J.H., O Deus dos oprimidos, Paulinas, São Paulo, 1985, pp. 92-93.
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