setembro 25, 2009

Eugênia partiu comovendo a cidade com sua história de amor

Marilene, Marcílio, Eugênia e Aníbal
Foto:
Rogelio Casado
Manaus - Amazonas - Brasil
2006

Nota do blog: Primeiro foi Anibal Beça a nos deixar. Hoje faz, exatamente, um mês. Ontem, foi Eugênia Turenko quem não resistiu à dor da perda do amado companheiro e saiu de cena. Uma história de amor (in) explicável. Foram amantes até mais não poder. Frutos dessa união: Sacha, Rodrigo e Anibito. Mesmo os que não conheciam de perto o casal comoveram-se com amor tão desmesurável. Eugênia foi professora de psiquiatria na Universidade Federal do Amazonas. Conhecemo-nos anos 1970. Divide com Manoel Galvão a intrudução das leituras de Jacques Lacan no estado do Amazonas. Ela deu a conhecer tais leituras através de artigos na imprensa local; ele até hoje desenvolve o seu "Psicanálise na cultura". Na fotografia acima, Eugenia divide com o casal Marilene Corrêa da Silva Freitas e Marcílio Freitas a alegria pelos 60 anos do querido poeta. Ontem foi dia de luto. Hoje, a luta continua. Em memória do casal, Coplas de virgo, do saudoso poeta.

Coplas de virgo

Anibal Beça


Há um cheiro de angústia nos teus olhos
amputado no meio desta sala.
E este mistério basta-se em silêncio
apascentando os demos desta noite.

E é assim que eu não querendo ver eu vejo
madeira tosca a se rachar no tempo
os caules duros tão particulares
reconstruídos no covão das horas.

Pois que do tempo bebo alimentando
a tua singular fisionomia.
Aquela mesma que ficou plantada
de grãos e pêlos rubra arquitetura.

E repousei caído em teus desígnios
e a água não era mais a mesma água
e a praia desnudava-se dos olhos
de ter e ver o verão do teu corpo.

E tua geografia era uma ilha
relva fresca de brisa amanhecida
que águas do meu instinto roçagavam
acordando gaivotas no teu ventre.

E éramos sós, o vôo da paisagem
em duas asas alargando a noite
e displicentes palmilhamos rastros
e nos perdemos na linguagem única.

Amarantíssimo ansiar de chamas
fuga fugaz em tempo de equinócio
onde o dia e a noite são no avesso
a própria conjunção dos girassóis.

Que vibrem as cigarras de setembro
instante de pálpebras frementes
que o nosso alumbramento encadeado
são o elo perene do silêncio.

Ah, duração de gozo interminável
onde o tempo é objeto sem valor
pois o moto maior de todo amante
é um antigo relógio sem ponteiros.

Ah, o lobo da memória me assaltando
a devorar auroras e crepúsculos
mas me salva este mar da lua espelho
onde liberto sou e recomeço.
Posted by Picasa

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