abril 14, 2011

Bióloga critica o projeto do Fun Park e apela por uma mudança de lugar

PICICA: A bióloga Elisa Wandelli, integrante do movimento socioambienal "SOS ENCONTRO DAS ÁGUAS", critica o local escolhido para a construção do denominado FUN PARK, às margens do Encontro das Águas. Saiba o porquê.

Antiga torre da Embratel (Mirante Encontro das Águas ou Fun Park da COPA 2014)

A área da antiga torre da Embratel, local na margem do Encontro das Águas onde a Prefeitura da gestão do Serafim Correa pretendia construir o Mirante Encontro das Águas, onde o Prefeito Amazonino Mendes declarou que iria construir um aquário e onde o atual governo do Estado diz que vai construir um Fun Park para a COPA 2014, é um dos locais mais cênicos do mundo e encontra-se em completo estado de abandono e degradação.

Apesar da rara e importante falésia* de 90 m de altura permitir a mais ampla e esplendorosa visão do Encontro das Águas o que propiciaria o lazer, atividades educativas e científicas para o amazonense e o turista, inacreditavelmente este bem público natural e cultural sofre contínuo processo de erosão, a borda do mirante apresenta risco de desabamento e a grade que isola os visitantes do penhasco ruiu em vários pontos. O lixo toma conta do local e o abandono da área faz com que marginais depredem ainda mais e coloquem em risco a vida dos que querem apreciar a paisagem. Mesmo assim muitas comunidades da Zona Leste usam o local como área de lazer e realizam piqueniques nos fim de semana sobre as centenárias mangueiras, mas sem nenhuma orientação da Secretaria Municipal de Meio Ambiente (SEMMAS), que ainda é a responsável pela área. O Movimento SOS Encontro das Águas tem usado continuamente esta área para realizar as mobilizações sociambientais que clamam pela preservação do Encontro das Águas, e estão incrédulos com o descaso de nossos governantes contra este bem comum tão valioso.

A conservação do Encontro das Águas e a recuperação paisagística da depredação causada pelo Distrito Industrial e a falta de planejamento do uso do espaço publico e urbano são a pautas do movimento SOS Encontro das Águas, formado por representantes de vários setores sociais, inclusive comunitários da região do Encontro das Águas. A recuperação desta falésia e a transformação da Embratel em um espaço de lazer, educação, turismo e pesquisa é uma reivindicação antiga do movimento. Um dos membros do SOS Encontro das Águas, o jovem Luis Lima Carvalho, morador da Colônia Antonio Aleixo já realizou uma proposta de projeto amazônico para o mirante. No entanto, a recuperação paisagística da antiga torre da Embratel para o fim que se propõe tem que englobar todo o entorno do degradado Distrito Industrial, a depauperada orla do rio Negro e a tenebrosa estrada que conduz até este local. A paisagem do caminho é repleta de galpões precários do distrito industrial que desmatam, acumulam lixo sem o mínimo senso de estética. O castanhal do Aleixo foi derrubado para construção de Conjunto Habitacional Federal, para construção da estação de tratamento de água e devido à falta de fiscalização, a fabrica de cimento com sua imensa área degradada libera poeira diuturnamente, há invasões e destruição paisagística por todo a parte. Todo o lixo e entulho retirado da região do PROSAMIM no centro da cidade foi depositado nesta região, aterrando as nascentes do lago do Aleixo. Ou seja, todo o caminho da zona leste terá que sofrer intervenção paisagística par que possamos chegar ao Encontro das Águas felizes por estarmos na Amazônia, e não em uma pobre selva de pedra com baixa qualidade de vida.

“Fun Park” na antiga SIDERAMA e não no Mirante do Encontro das Águas

A torre da Embratel é um local que se adéqua para um mirante e museu, mas não para abrigar grande concentração de pessoas em um só momento, como um “Fun Park” demanda, o que exigiria enormes áreas para estacionamento e desmatamento da área. O "Fun Park" que o governo do Estado pretende construir na torre da Embratel deveria ser construído na forma de um Centro Cultural e de Lazer na antiga SIDERAMA, grande área de alto valo cênico situada também as margens do Encontro das Águas ao lado do Porto da CEASA e que é próxima de comunidades que poderão usufruir melhor deste espaço no período da COPA e após seu termino.

O Projeto de Oscar Niemeyer

O valor do arquitetonico da obra de Niemeyer é incontestável e logicamente ações 
paisagísticas devem ser realizadas urgentemente na área. De todas as diferentes 
propostas governamentais que a opinião pública teve acesso está é a mais condizente
com o valor ambiental e cênico da área. No entanto, prefeririamos ter sobre o 
Encontro das Águas uma obra mais regionalizada e mimética ao ambiente. O projeto
irá produzir um ambiente muito árido sem árvores, o que impedira o visitante de ter 
um ambiente naturalmente fresco e observar os pássaros que visitam o Encontro das 
Águas em seus processos migratórios pelo mundo todo. O projeto não prevê a 
conservação e a visualização dos perfis geológicos e pedológicos da falésia, que 
também é  um importante atributo turístico e educacional. A prática de escalagem 
podem ser realizada ao longo da falésia e placas de vidro poder ser colocadas sobre 
os perfis para permitir a observação geológica. A preservação dos sítios 
arqueológicos existentes nesta área não foi contemplada no projeto e possivelmente 
serão concretadas, assim também como ações para preservação e recuperação da 
vegetação não foram considerados. Se Niemeyer tivesse tido oportunidade de visitar 
in loco a riqueza cênica, geológica, arqueológica, paleológica, ecológica e cultural 
do mirante do Encontro das Águas, certamente teria desenhado um projeto ainda 
mais belo e amazônico.
 
O importante é que os atributos naturais e culturais da área do mirante sejam 
preservados e que a população local e o visitante tenham livre acesso a mais 
esplêndida vista do Encontro das Águas.

  
Sítio Geológico Ponta das Lajes

O local designado para construção do Mirante Encontro das Águas (ou o “Fun Park”) faz parte do complexo geológico denominado “Sítio Geológico Ponta das Lajes”. Este sítio é constituído por uma falésia* de 90 m de altura, de onde se contempla o Encontro das Águas dos rios Negro e Solimões,  em cuja base ha um afloramento arenítico que se projeta nas águas do rio Negro para o centro do leito do rio Amazonas na forma de uma imensa laje arenítica que emerge na estação seca. As rochas desse fenômeno geológico são arenitos silicificadas da Formação Alter do Chão, do período Cretáceo (aproximadamente entre 145 milhões e 65 milhões de anos atrás) e a região foi submetida a processos neoectonicos, cujos registros observam-se nos perfis expostos.

Este complexo geológico foi descrito pelos Professores da UFAM Elena Franzinelli e Hamilton Igreja e por sua excepcionalidade na bacia sedimentar amazônica foi aprovado pela Comissão Brasileira de Sítios Geológicos e Paleobiológicos (ABC-ABEQUA-CPRM-DNPM-IBAMA-IBGE-IPHAN-PETROBRÁS-SBE-SBGEO-SBP) como Sítio Geológico do Brasil a ser preservado como patrimônio natural da humanidade. (Ver http://vsites.unb.br/ig/sigep/propostas/Ponta_das_Lajes_AM.htm)

Além da raridade geológica, geomorfológica, pedológica, geológica, morfológica e cênica, da falésia e da laje arenítica de aproximadamente nove ha, o “Sítio Geológico Ponta das Lages”, registra importantes arquivos fósseis e arqueológicos como pinturas rupestres, registros líticos e terras preta de índio com suas cerâmicas e urnas funerárias.

Sítio arqueológico

A densa população de habitantes pré-colombianos que a grandiosidade biológica do Encontro das Águas abrigou propiciou o legado de grande quantidade de sítios arqueológicos constituídos principalmente de ricos utensílios e urnas funerárias  de cerâmicas encontrados nas terras preta de índio, fértil solo de origem antrópica.  Somada a riqueza biológica, a enigmática paisagem da região do Encontro das Águas fez com que a falésia e a laje arenítica fosse possivelmente um local de contínuas visitas e realização de rituais de diversos povos em diferentes épocas na Amazônia, o que faz com que haja uma importantíssima diversidade de vestígios arqueológicos.

Em novembro de 2010, durante a vazante estrema, membros do movimento SOS Encontro das Águas mudaram o conhecimento etnoarqueológico sobre os povos do Encontro das Águas, ao registrarem em um levantamento arqueológico na Ponta das Lajes a existência de um importante sítio arqueológico não cerâmico, bastante raro para a região. Este novo sítio arqueológico encontrado nas Lajes na forma de gravuras rupestres, conjuntamente com a raridade paisagística, geológica e paleontológica do Sitio Geológico Ponta das Lages, aumentou ainda mais a necessidade de sua criteriosa conservação. Infelizmente este sítio arqueológico que já é submetido às intempéries hidrológicas porque é anualmente inundado e seus principais painéis passaram décadas submersos, recebem também a ação corrosiva dos resíduos industriais lançados no Encontro das Águas pelo Distrito Industrial da SUFRAMA e pela ação predatória de exploradores do Arenito Manaus das lajes para obtenção do minério para construção civil. Até a década de 80 exploradores de rochas  dinamitaram grande parte das bordas e da superfície das lajes e da base da falésia, o que deve ter causado a perda de muitos vestígios arqueológicos deste sítio. Este sítio Geológico está sendo registrado no IPHAN e pesquisado pelos trabalhos dos professores de arqueologia da UFAM e USP.

*Falésia é uma elevação de relevo constituída por uma encosta vertical extremamente abrupta e íngreme (ou penhasco) que termina no nível do mar ou do rio e sofre erosão hídrica.

Elisa Wandelli

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