novembro 16, 2011

De como naturalizar o surgimento das comunidades terapêuticas e flexibilizar normas para seu funcionamento, em detrimento de políticas consagradas no campo das drogas

PICICA: Em discurso para parlamentares, a Secretaria Nacional sobre Drogas, do Ministério da Justiça, naturalizou o surgimento das comunidades terapêuticas e sua proliferação em todo o país - 80% dos abusadores de drogas são tratados nestes serviços -, como se o "fenômeno" não fosse resultado da crônica debilidade dos investimentos em políticas públicas nas instâncias municipal, estadual e federal. Ao que se saiba, por sua vez, nenhum parlamentar contestou o fato de que a Presidência da República capitulou diante do fundamentalismo cristão e da manipulação midiática, que cotidianamente inunda o país com notícias sensacionalistas sobre a relação da sociedade com as drogas, um subproduto da política de "Guerra contra as drogas", cuja validade caducou. Os meios de comunicação, mais interessados no sensacionalismo do que na precisão da informação, criaram um falso consenso, deixando o consumidor de notícias muito longe de compreender a verdadeira trama de interesses e dos jogos de poder envolvidos no imbróglio que resultou na medida higienista da internação compulsória e do investimento de recursos financeiros no setor privado conhecido como comunidades terapêuticas. Uma vez criado os "fatores emocionais", sem que fossem ouvidas algumas instâncias de consultoria, como a Área Técnica de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas do Ministério da Saúde, tratou-se de derreter os corações das instâncias decisórias do poder público - dessa vez o Parlamento, onde há um forte lobby religioso pro-comunidades terapêuticas - o que seria uma tarefa fácil, não fosse a resistência da militância do movimento por uma sociedade sem manicômios, que vem denunciado o retrocesso imposto à Política Nacional de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas. Basta ver a flexibilização a que foram submetidas as normas de funcionamento das referidas comunidades terapêuticas pela Agência de Vigilância Sanitária, como se a passagem do tempo tivesse comprometido o acerto técnico das medidas ali dispostas. Pode-se enganar a opinião pública durante algum tempo, muito tempo, mas não o tempo todo. Em contrapartida, veja, também, os frutos da desmanicomialização dos serviços de saúde mental no campo do enfrentamento das drogas, incluída aí as práticas de redução de danos, carente de mais e melhores investimentos, seja na expansão dos serviços ou na formação de pessoal para os cuidados exigidos pelos usuários e abusadores de drogas. Serviços com o de Pelotas passaram ao largo do discurso da Secretaria Nacional sobre Drogas. Esses serviços devem conviver, doravante, com a proliferação de clínicas para drogados (uma outra categoria de assistência a ganhar novo estímulo com as medidas do governo federal): uma espécie de reedição dos hospícios. O resultado é previsível. O controle social terá muito trabalho pela frente.



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