abril 27, 2012

CRP SP põe em discussão: "Em nome da proteção e do cuidado, que formas de sofrimento e exclusão temos produzidos?" / Um apelo às irmãs Sampaio.

PICICA: As irmãs Conceição Sampaio e Socorro Sampaio, respectivamente deputada estadual e vereadora, surpreendem no parlamento pelo apoio a efetivas ações de saúde mental. O gesto é raro entre parlamentares. No caso da Câmara, Socorro é uma das poucas vozes a se manifestar. Já na Assembléia, Conceição conta com a voz atuante do deputado Luiz Castro. Entretanto, enquanto Socorro apoia, acertadamente, a implantação de um Centro de Atenção Psicossocial AD (para abusadores de álcool e outras drogas), Conceição foi induzida a um equívoco ao apoiar a criação de um Centro Público de Tratamento para Dependentes Químicos. Essa indução decorre do silêncio das assessorias do campo da saúde mental, que preferem engolir a seco decisões que contrariam a laboriosa experiência construída pela reforma psiquiátrica antimanicomial, depois que a presidenta da república desconsiderou decisão tomada pela IV Conferência Nacional de Saúde Mental. Investir em estruturas isoladas é um contrasenso, na medida em que reproduz um modelo superado de atenção e cuidados aos abusadores de álcool e outras drogas. A trágica experiência das clínicas para "dependentes químicos" (um outro equívoco conceitual) foi fartamente documentada pela mídia nacional. Além do mais, cada vez nos distanciamos da Política de Saúde Mental, aprovada pelo Conselho de Saúde Mental do Estado do Amazonas, que previa a desativação do Hospital Psiquiátrico Eduardo Ribeiro para dar lugar a um Hospital de Clínicas, devidamente verticalizado, com todas as clínicas ocupando seus respectivos andares - inclusive a de saúde mental, e por que não para o público abusador de psicoativos e álcool? Com isso, estaríamos dando mais racionalidade para o sistema, posto que atualmente o corpo do cidadão vem sendo esquartejado pela divisão das nossas unidades de saúde ("problemas de osso" no Hospital Adriano Jorge, na zona sul; "problemas neurológicos", no Hospital João Lúcio, na zona leste; e assim por diante). Num momento que a mobilidade urbana passou a se constituir num grave problema, é um contrasenso abandonar essa idéia, inclusive por que especula-se sobre a desativação do Hospital Psiquiátrico em razão dos projetos de saúde exigidos pela Copa do Mundo de 2014, notícia que trouxe inquietações para o setor e para quem depende de uma rede consistente de saúde mental, que tarda em Manaus. Mais uma voz no parlamento pode fazer a diferença. Teríamos três vozes a cobrar medidas coerentes com os princípios éticos da reforma psiquiátrica antimanicomial que queremos, para que não sobrevenha o mesmo destino a instituições assemelhadas aos manicômios. A degradação de suas práticas é uma questão de tempo. 

Em nome da proteção
e do cuidado, que formas
de sofrimento e exclusão
temos produzidos? 

No ano em que se comemora os 50 anos da regulamentação da Psicologia no Brasil, o tema da Semana da Luta Antimanicomial nos remete às motivações dos primeiros tempos de organização do movimento antimanicomial e traz uma oportunidade de reflexão. Para tanto,é necessária uma análise crítica, não moralista e não conservadora, dos atuais discursos e práticas relacionadas as questões de Saúde Mental no estado de São Paulo.

Atualmente o uso abusivo de drogas é identificado como epidemia e associado à marginalidade avançada, alimentando a cultura do medo que produz pânico e autoriza a violência. Apesar dos mecanismos legais de regulamentação, na ânsia do governo em limpar das ruas os “indesejáveis”, observa-se no cotidiano ações violadoras de direitos, uma polícia repressora e sem acolhimento e práticas de cuidado desarticuladas.

Tudo isso reforça o ataque aos direitos humanos, aos princípios do SUS e da reforma psiquiátrica, quando assistimos à retomada das internações involuntárias e compulsórias em clínicas privadas.

Diversas ações apresentadas como acolhimento e tratamento, na verdade configuram-se em práticas manicomiais, numa reedição das políticas higienistas do século XIX, com a medicalização e o encarceramento dos desajustados. As saídas apressadas, preconceituosas e criminalizadoras encontram contraponto naquilo que foi construído pelos movimentos sociais antimanicomiais e preconizado na Rede de Atenção Psicossocial e nos princípios e diretrizes da Reforma Psiquiátrica.

Entendemos e lutamos para que o local de acolhimento e tratamento continue sendo a rede aberta do SUS. É urgente promover modelos centrados no desenvolvimento de projetos de cuidado, no território do sujeito e suas redes sociais. É fundamental a revisão crítica do papel hegemônico e centralizador dos hospitais psiquiátricos, o respeito aos direitos humanos e civis dos loucos e usuários de drogas, enfim, dos mais vulneráveis.

Nossa posição é coerente com a ampla mobilização social que resultou na IV Conferência Nacional de Saúde Mental e XIV Conferência Nacional de Saúde, fóruns legítimos de um estado democrático de direito, que decidiram: comunidades terapêuticas não cabem no SUS, bem como as internações compulsórias.


Para contribuirmos com essa reflexão preparamos uma semana de debates, manifestações públicas, eventos culturais e festivos, para comemorarmos as conquistas importantes já alcançadas! Confira a programação que preparamos e sinta-se à vontade para contribuir para a construção de um mundo mais solidário e menos repressor.

Clique aqui e leia a Carta Aberta da Frente Estadual da Luta Antimanicomial sobre o Ato de 18 de maio.

Fonte: CRP SP

Um comentário:

Conceição Sampaio disse...

Caro amigo Rogélio, gostaria muito de me reunir com você, para que pudéssemos conversar a respeito deste tema, que é tão importante para mim, minha irmã e, claro, para as milhares de famílias que convivem com o drama da dependência química. Gostaria que você enviasse seus contatos para meu e-mail, para agendarmos essa reunião: deputada.conceicaosampaio@aleam.gov.br

Abraços, Conceição Sampaio