agosto 16, 2012

Parabéns, Mestre Bruno Cava!

PICICA: "O senso comum está do lado da polícia. No limiar da modernidade, o estado foi fundamentado como solução para desordem humana. O direito, como mediação de conflitos particulares e contenção da criminalidade. O estado moderno, um “mal necessário”, defendem os corações burgueses mais humanistas, porém o que de melhor a civilização humana pôde oferecer diante da natureza oscilante e imprevisível, em todo caso perigosa, dos homens. Quem vai cuidar de nossos filhos? Negri contesta os pensadores mais notáveis na fundamentação desse senso comum. E rasga outra modernidade, uma alternativa antimoderna. De Maquiavel a Spinoza a Marx, três malditos em desafio e escárnio diante da concepção jurídica do mundo. Minhas bússolas em impudência."
Convido os chegados da UniNômade à defesa deste mestrando em filosofia do direito, na UERJ, 14:00 do dia 24. Uma palhinha: "Escrito na prisão e publicado em 1981, quando os conflitos e movimentos dos anos 1970 pareciam abafados pela repressão e um consenso conservador da “esquerda” à “direita” partidária governava na Itália; Anomalia Selvagem reafirma a filiação de Antônio Negri ao pensamento da positividade. Não se abatendo com a ciranda da história, o maestro se concentrou em Spinoza para abraçar ainda mais uma ontologia constituinte e afirmativa. Para se animar com uma ontologia do ser pleno, sem concessões a derrotismos, catastrofismos ou outras paixões deprimidas da razão. Da intrincada malha de tratados, proposições e escólios, Negri desenovela o fio vermelho de uma política radical e transformadora. A ontologia spinozana transpira de política por todos os poros, uma política de baixo pra cima, uma política materialista que não separa razão e desejo. Propõe uma práxis revolucionária diretamente no dilacerar a trama do presente, na materialidade do agir, do fazer. A modernidade assistiu ao nascimento da concepção jurídica do mundo. De imediato, os defensores da modernidade colocaram como tarefa do pensamento filosófico fundamentar esse poder de novo tipo, vestindo-o com o manto da legitimidade e da justiça. Teorias voltadas a garantir o soberano, sua lei, seu direito, sua violência legítima. De Hobbes a Hegel, de Rousseau a Kant, várias as tentativas de elevar-se sobre as paixões, as vontades e as volúpias das plebes. Quantos funcionários do poder não recorreram e continuam recorrendo às “verdades eternas”, que o homem deixado a seu bel prazer invariavelmente abusa do que pode, passa a perseguir fins condenáveis e praticar regularmente o mal; que não é prudente relaxar demais a lei e a punição; que o povo precisa de alguém para guiá-lo e só respeita um poder maior. Mesmo o mais ignaro popular não discordaria disso. Então, por que seríamos arrogantes, nós os ilustrados do novo tempo, a ponto de conceder-lhe o valor que ele mesmo não reclama, em vez de simplesmente dar ao povo o que, sem romantismos, ele mais precisa e deseja: ordem e autoridade? Temos de oferecer pelo menos um norte, um sistema razoável de normas e valores, em que o homem comum possa acreditar e confiar. O senso comum está do lado da polícia. No limiar da modernidade, o estado foi fundamentado como solução para desordem humana. O direito, como mediação de conflitos particulares e contenção da criminalidade. O estado moderno, um “mal necessário”, defendem os corações burgueses mais humanistas, porém o que de melhor a civilização humana pôde oferecer diante da natureza oscilante e imprevisível, em todo caso perigosa, dos homens. Quem vai cuidar de nossos filhos? Negri contesta os pensadores mais notáveis na fundamentação desse senso comum. E rasga outra modernidade, uma alternativa antimoderna. De Maquiavel a Spinoza a Marx, três malditos em desafio e escárnio diante da concepção jurídica do mundo. Minhas bússolas em impudência. Contra o problema do fundamento da moral, do direito ou do estado, uma máquina de guerra anti-idealista, no maravilhamento e vertigem da imanência. A subversão spinozana divorciou a teologia da ontologia. Um Spinoza crítico do transcendente, do finalismo, do estado e do mercado. Não só expulsou Deus como não O deixou voltar travestido pela janela. A democracia de que fala Spinoza, e Negri se constrói na práxis, de baixo pra cima, na terra do materialismo absoluto. A concepção da crise do mundo recusa o contrato social e o mercado, em favor da organização autônoma da produção e sem quaisquer mediações. As essências, essas criaturas singulares, todas elas habitam o mesmo plano ontológico, na superfície do que a política compõe e decompõe as forças --- uma política de autoprodução do ser, da democracia e da felicidade. Amar a verdade só é possível numa paixão ao real, em que aquela age como práxis. Bem diferente das pirâmides normativas e edifícios axiológicos, onde distintas ordens do ser transmitem valor e legitimidade de cima a baixo, um esquema hierárquico cuja motivação é pedir fidelidade ao tirano. A imanência se organiza, à transcendência se é fiel. A doutrina do judeu maldito dispensa juntos o Céu e o Inferno, todos os sacerdotes de uma só vez, e reconstrói a causalidade eficiente na gênese das forças de tudo o que existe. Simplesmente tudo, sem exceção. Não há lugar para a modernidade no Spinoza de Negri. Em vez de teorias sobre a melhor forma de estado, teorias sobre a melhor forma de libertar-se do estado. De destruí-lo de baixo a cima, a começar pelo estado em nós mesmos, na nossa própria economia de paixões."
Fonte: Bruno Cava

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