setembro 25, 2012

"Freixo: 'Prefeitura tem de romper relações fisiológicas com braço político das máfias'", por Maurício Thuswohl

PICICA: A matéria abaixo não inclui o vídeo. Este faz parte da rede de apoio ao mais perigoso dos parlamentares: aquele que faz crer que vale a penar fazer política.  


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Freixo: 'Prefeitura tem de romper relações fisiológicas com braço político das máfias'

Mais bem colocado para provocar o segundo turno contra Paes, candidato do PSOL à Prefeitura do Rio promete profunda mudança de rumos na gestão municipal
Freixo: 'Prefeitura tem de romper relações fisiológicas com braço político das máfias'
Freixo tem apoio de artistas e boa aceitação entre a classe média, mas enfrenta dificuldade entre os mais pobres (Foto: Adriana Lorete. Gabinete Freixo)
Rio de Janeiro – A exatas duas semanas do encerramento oficial da campanha eleitoral, as pesquisas de opinião indicam que somente uma candidatura apresenta viés de crescimento capaz de provocar o segundo turno no Rio de Janeiro e dificultar a vida do atual prefeito Eduardo Paes (PMDB) em sua tentativa de reeleição. Candidato pelo PSOL, o deputado estadual Marcelo Freixo aposta no segundo turno e, para virar o jogo contra Paes, conta com a popularidade adquirida na cidade depois que presidiu a CPI das Milícias e ajudou a colocar na cadeia alguns líderes – entre eles, parlamentares – das máfias paramilitares que dominam atividades como o transporte alternativo e o fornecimento de gás e tevê a cabo em parte da cidade.
A coragem contra as milícias cobrou seu preço – sua família chegou a receber ameaças – e Freixo se afastou do Brasil por dois meses no ano passado, quase desistindo da candidatura a prefeito. Agora, mesmo que seus apoiadores tenham sido aconselhados a manter discrição em pontos “perigosos” do Rio, vislumbra a possibilidade de vitória e diz esperar que a forte militância do PSOL na cidade faça diferença nessa reta final.
Em entrevista exclusiva à Rede Brasil Atual, concedida horas antes de participar do maior comício de sua campanha, na sexta-feira (21), Freixo afirma que pretende “reabrir os canais de comunicação com a sociedade por meio dos conselhos, das associações de bairro e dos sindicatos” e promete “mudanças de rumo muito profundas no conceito de gestão municipal”. O candidato do PSOL fala também de cultura e garante que, se eleito, saberá compor um governo que “não seja controlado por cúpulas partidárias”. Leia a seguir a íntegra da entrevista:
Por que o senhor quer ser prefeito do Rio? Se vencer as eleições, qual marca imagina que sua gestão à frente da Prefeitura deixará na cidade?
Em 25 anos trabalhando em defesa dos direitos humanos e nos dois mandatos como deputado estadual, reuni vários setores da sociedade civil que lutam por causas diferentes que, em comum, buscam Justiça e a garantia de direitos básicos da população. Concluímos que vivemos em uma cidade surda às necessidades dos seus moradores. Hoje, o carioca não tem como participar das decisões mais importantes que envolvem o Rio. Acho necessário reabrir os canais de comunicação com a sociedade por meio dos conselhos, das associações de bairro, dos sindicatos, por exemplo.
Vou deixar para o carioca, em primeiro lugar, uma cidade com mecanismos de participação continuada e qualificada para que cada morador possa participar da construção de um Rio mais justo. Além disso, a cidade apresenta sérios problemas nas áreas de saúde, transporte e educação. Quero tirar a saúde do Rio da crise, devolver às escolas a alma, investindo na qualidade do ensino, e melhorar a mobilidade na cidade.
Sua candidatura tem o apoio de figuras expressivas da cultura, a começar pelo próprio vice, o músico Marcelo Yuka. Como o senhor pretende melhorar o acesso da população carioca aos eventos e equipamentos culturais? 
Os shows são bem-vindos, mas precisamos valorizar e viabilizar a produção cultural de cada bairro do Rio. Política de cultura não é política de espetáculo. A principal meta é instituir de fato o chamado “CPF” da Cultura, um sistema de Conselho, Plano e Fundo municipais. Assim, será possível elaborar uma política municipal que garanta a produção e o acesso a bens culturais por toda a cidade. Também pretendo resgatar o projeto das lonas culturais e transformá-las em arenas com múltiplos usos e propostas de produção cultural. Além disso, precisamos voltar a investir em bibliotecas públicas nos bairros e integrar a rede de ensino ao circuito cultural da cidade, principalmente nos bairros mais carentes de equipamentos. Queremos que a política de cultura se aproxime das escolas públicas e faça delas instrumentos de reconquista de territórios.
Como está sendo até aqui sua campanha nas áreas controladas pelas milícias? O senhor já foi coagido ou ameaçado durante a campanha?
Não fui ameaçado durante a campanha, mas na zona oeste, onde é forte a presenças das milícias, por motivos de segurança, orientamos os militantes a não se expor a riscos, a não abrir comitês voluntários, por exemplo, nos locais críticos. Orientamos os militantes a tomarem cuidado nas atividades nessas regiões. No começo da campanha, antes de visitar regiões como Campo Grande e Bangu, nós enviamos ofícios ao Tribunal Regional Eleitoral dando ciência das atividades e pedindo providências para garantir a segurança não só minha, mas de todos os candidatos. A militância nas redes sociais tem nos ajudado a entrar com nossas propostas nessas áreas.
Sempre vem à tona a relação indireta da prefeitura do Rio com grupos milicianos que teriam o direito de explorar o transporte alternativo. Como o senhor, se eleito, pretende modificar essa realidade?
Ao contrário do que muita gente pensa, o enfrentamento das milícias não é da competência exclusiva da polícia. Como todo crime organizado, depende de uma série de ações bastante complexa que envolve a união de forças municipais, estaduais e federais. No caso da prefeitura, há uma responsabilidade direta no que se refere, por exemplo, à regulamentação e à fiscalização do transporte alternativo. O atual prefeito nada fez nesse campo e até foi conivente com o avanço dessas máfias. Realizou reunião dentro da prefeitura com milicianos e fez licitações por cooperativas, como eles queriam, e não de forma individual, como recomendava o Relatório Final da CPI das Milícias da Alerj, de 2008.
Dessa forma, as milícias não sofreram qualquer enfrentamento da parte do poder público municipal em sua principal fonte econômica, a exploração das vans e kombis. Como novo prefeito, vou cumprir, enfim, o que a CPI recomendou quatro anos atrás. Também cabe à prefeitura romper a lógica das relações fisiológicas com os braços políticos dessas máfias. É o Estado que tem de suprir as comunidades dos serviços públicos básicos para que o crime organizado não explore essa lacuna com suas práticas assistencialistas e clientelistas, com os chamados centros sociais.
Qual sua estratégia para essa reta final de campanha? É possível vencer Eduardo Paes no segundo turno?
O atual prefeito busca vencer a eleição no primeiro turno porque sabe que se nós disputarmos um segundo turno, a situação ficará bem mais complicada para ele. No segundo turno, os dois candidatos têm o mesmo tempo de TV e os projetos de cidade são debatidos de maneira muito mais profunda. Com o calendário que a cidade terá, com Copa, Olimpíada, Copa das Confederações e Jornada Mundial da Juventude, não estamos escolhendo nestas eleições um governo para os próximos quatro anos. Estamos decidindo o projeto de cidade para as próximas décadas. O Rio precisa do segundo turno para que o eleitor tenha mais informações antes de fazer essa escolha. Nessa reta final, venho participando de muitos debates, às vezes três num mesmo dia, e percorrido todas as regiões da cidade.Tenho muita convicção de que nós podemos chegar ao segundo turno.
Em diversos momentos da história recente, as candidaturas de esquerda à prefeitura do Rio deixaram a vitória escapar porque, ironicamente, seus votos foram mais abundantes nas áreas ricas do que nas pobres. Como reverter essa tendência?
Nossa opção por não fazer alianças espúrias, fisiológicas, resulta no nosso pouco tempo de tevê (um minuto e vinte e dois segundos), o que dificulta o acesso a informações sobre a nossa campanha. O atual prefeito conta com mais de 16 minutos e tem, pelo menos, quinze vezes mais recursos do que a gente. Ainda assim, somos os únicos que crescemos nas pesquisas e temos o menor índice de rejeição. Nesta campanha, percorri toda a cidade e, nas últimas semanas, tenho ido mais intensamente à zona oeste e também à zona norte, sempre discutindo os problemas da cidade e o nosso projeto. A militância, com seus mais de 100 comitês voluntários, também tem sido fundamental para impulsionar a campanha nos bairros.
O PSOL é um partido com grupos internos que em muitos momentos divergem entre si sobre a política de alianças a ser adotada. Com quais forças políticas o senhor pretende governar?
Não será um governo controlado por cúpulas partidárias. Temos um compromisso de campanha muito claro: a nossa aliança com a sociedade civil. Nossa proposta é de um governo participativo, com o fortalecimento dos conselhos de políticas públicas e comunitários, em um processo que envolverá, por exemplo, uma parceria intensa com as universidades. O nosso programa apresenta propostas que representam mudanças de rumo muito profundas no conceito de gestão municipal. Não haverá divergência interna partidária que venha a pesar mais do que a consciência e a responsabilidade de tornar realidade tais mudanças, no sentido de fazer a Prefeitura funcionar para promover a qualidade de vida de quem vive na cidade e não como gerente de um balcão de negócios.
Aqui no Rio já se fala em um “partido do futuro”, que reuniria independentes (com destaque para o grupo de Marina Silva) e setores do PSOL, do PV e da esquerda do PT. O que o senhor acha da ideia? Acredita numa mudança no tabuleiro partidário brasileiro?
No momento, estou totalmente concentrado em trabalhar muito para chegar ao segundo turno nestas eleições municipais no Rio de Janeiro. Não é hora, portanto, de qualquer avaliação desse gênero. Esse tipo de avaliação vai ter que ficar para depois.

Fonte: Rede Brasil Atual

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