agosto 29, 2014

"Quem tem medo de Marina?", por Bruno Cava Rodrigues

PICICA: "A polarização entre PT x PSDB acabou de vez. Não só politicamente. O imaginário esgotou. As velhas demarcações perderam poder de mobilizar. Os esquemas tão válidos em 2010, 2006 e 2002 se dissolveram. Daqui pra frente, quem insistir nos mesmos esquemas mentais pode acabar reduzido a guetos, perdendo a capacidade de afetar e ser afetado."

Marina Silva

A polarização entre PT x PSDB acabou de vez. Não só politicamente. O imaginário esgotou. As velhas demarcações perderam poder de mobilizar. Os esquemas tão válidos em 2010, 2006 e 2002 se dissolveram. Daqui pra frente, quem insistir nos mesmos esquemas mentais pode acabar reduzido a guetos, perdendo a capacidade de afetar e ser afetado.

As manifestações de 2013 exprimiram o desejo por uma polarização diferente. Fissuras se abriram e gases que vinham se condensando vazaram sob alta pressão em muitos sentidos. A nuvem agora chegou nas eleições e paira sobre a cabeça de Marina. Ela não é causa, está sendo atravessada. O dissenso é tão agudo que, a não votar ou votar nulo, preferem perturbar o sistema político representativo com uma candidata claramente indesejada. E quanto mais aecistas e dilmistas se insurgem mobilizando os velhos argumentos e esquemas, mais Marina se fortalece, porque o voto nela se apoia justamente no fato dela ser indesejada, dela gerar crise e mexer com as certezas. E quanto mais aparecerem ataques que Marina tem “cara de empregada”, ou que é mulher, negra, acriana e evangélica, mais ela se fortalece.

A situação lembra aqueles filmes de ficção científica: as tentativas desastradas de evitar que um futuro indesejado se realize acabam desencadeando a sequência de acontecimentos que o confirmam. Então não adianta culpar Marina agora. A responsabilidade pelo fracasso iminente da candidatura Aécio e os dias difíceis que virão pra de Dilma é deles próprios, que não souberam ouvir junho de 2013, perderam a capacidade de acompanhar as transformações da sociedade, não conseguiram renovar as instituições.

Mas Marina não é o centro de gravidade desse fenômeno gasoso. Se não souber relacionar-se com ele, pode ser expelida tão rápido quanto foi atravessada. Marina não é o Podemos, o novo partido espanhol, cujo antagonismo ao sistema político se baseia em círculos autônomos locais, redes do 15-M e núcleos de formulação política. Porque resolver a campanha por “cima” é fácil: que grande empresário ou grupo de interesses não quer financiar uma campanha com chances de vitória? Financiam várias.

Vivemos um momento de grande reorganização, que vai muito além das eleições ou de Marina, um tempo de transição para modular a escuta e ampliar a força dos movimentos. Essa percepção já vinha sendo compartilhada em vários espaços de discussão, e se confirma de novo. Os mais jovens, menos patrimoniais em seus gostos e artigos de identidade, não mostram nenhuma relutância em deixar velhos símbolos e ídolos de lado, em busca de possíveis novos.

Vão se isolar aqueles que se encastelarem em símbolos e termos antigos da disputa, que não se engajarem na construção das alternativas a uma representação esgotada. Muitas pessoas estão embarcando noutra coisa e querem, sim, fazer outra política.

Fonte: Quadrado dos Loucos

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