novembro 30, 2014

EL CUERPO DE LAS MUJERES

PICICA: "EL CUERPO DE LAS MUJERES es el título de nuestro documental de 25 minutos sobre el uso del cuerpo de la mujer en la televisión. Empezamos de una urgencia. La constatación que las mujeres, las mujeres reales, están desapareciendo de la televisión y que son reemplazadas por una representación grotesca, vulgar y humillante. La pérdida nos parece enorme: la cancelación de la identidad de las mujeres ocurre bajo la mirada de todos, pero sin que haya una reacción adecuada, ni por parte de las mujeres mismas. A partir de aquí, se abrió camino la idea de seleccionar las imágenes televisivas que tuvieran en común la utilización manipuladora del cuerpo de las mujeres para contar lo que está pasando no sólo a quien nunca mira la televisión, sino a quien la mira, pero "no ve". El objetivo es interrogarse y preguntar sobre las razones de esta cancelación, un verdadero "pogromo" del cual somos todos espectadores silenciosos. Luego, el trabajo puso de relieve la cancelación de los rotros adultos en la televisión, el uso de la cirugía estética para cancelar cada huella del paso del tiempo y las consecuencias sociales de esta remoción.
Traduccion de Chiara Bagnoli"


"Olhar, fotogenia e sociedade do espetáculo", por Andressa Monteiro

PICICA: "Para Deleuze, rosto é “placa nervosa” que nos revela o interior e conecta com desejo do outro. Mas e quando esta autenticidade choca-se com ditadura dos padrões estéticos?"

Olhar, fotogenia e sociedade do espetáculo



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Para Deleuze, rosto é “placa nervosa” que nos revela o interior e conecta com desejo do outro. Mas e quando esta autenticidade choca-se com ditadura dos padrões estéticos?

Por Andressa Monteiro

“Acima dos olhos e do coração está o desejo (…).
É o desejo que leva o ver a se transformar em ação de ver,
dando às paixões e ao intelecto movimento infinito.”

Giordano Bruno
Muitos acreditam que a beleza é mera questão de opinião. Outros creem que a alternativa de escolha do belo ou do feio carrega memórias afetivas e a presença ou ausência de preconceitos estéticos de homens e mulheres, como: harmonia, proporção, simetria, ordem, clareza, delicadeza, pele macia, cabelo espesso e brilhante, ou uma cintura marcada, por exemplo.

De acordo com a definição filosófica de Platão, a concepção de belo procura desviar-se da intenção, responsabilidade e julgamento humanos ao definir o conceito, deixando-o no campo da imaginação. Ele afirma: “o belo é o bem, a verdade, a perfeição. Existe em si mesmo, apartado do mundo sensível, residindo, portanto, no mundo das ideias. A ideia suprema da beleza pode determinar o que seja mais ou menos belo.”

Por outro lado, a ciência aponta que a beleza é um conceito mais flexível e menos romântico do que se imagina. A definição do que é ou não bonito e de traços físicos harmoniosos pode ser revelada desde o instante em que nascemos por questões de adaptação evolutiva e êxito reprodutivo.


O austríaco e ganhador do prêmio Nobel Konrad Lorenz sugere que “até as feições graciosas de uma criança servem como um artifício biológico para provocar sentimentos ternos com um objetivo claro: desviar o sentimento de agressão. Uma pele e cabelos macios, olhos e pupilas grandes, bochechas roliças, rosadas e um nariz pequeno fariam parte de uma tática de sobrevivência: se as crianças morressem por falta de cuidado dos pais, a natureza oferecia-lhes traços irresistíveis para que outros adultos pudessem ‘adotá-las’”. Isso também explicaria por que grande parte das pessoas se comove com bebês e filhotes.

Analisando rapidamente a perspectiva da simetria e do movimento renascentista presente em obras de Leonardo da Vinci e Michelangelo, quanto mais próxima uma face ou uma forma estiver de uma ordenação matemática proporcional, mais bela ela seria aos olhos do observador. É como se a argúcia da beleza estivesse ligada a certa necessidade humana de ordenar, organizar e entender o mundo da forma mais racional possível.

A definição de belo também debate conceitos econômicos e sociais por meio da venda de uma ideia de beleza consagrada e padronizada – evidente nas indústrias de moda, estética e midiática –, pela inspiração que causa em seus admiradores (poética do romantismo) e por um poder intrínseco que atrai a simpatia e a união por objetos ou causas comuns entre um grupo.

“Os intelectuais que afirmam que a beleza é relativa não ajudam a explicá-la”, afirma Nancy Etcoff, psicóloga da Universidade de Harvard e autora do livro A Lei do Mais Belo, lançado no Brasil em 1999. “Dá para dizer que há uma realidade central no belo. Afinal, em todas as culturas elementos semelhantes têm constituído uma força estética poderosa.”

Ninguém tem dúvidas de que a sociedade, a economia, a política, a religião, a psicologia, a filosofia e o ambiente influenciam e são influenciados por padrões estéticos de beleza nos tempos modernos.

Historicamente, a definição do belo é uma das maiores invenções da estética clássica, grega e romana, com três principais características formais: a ordem, a simetria e a proporção. Mas, por não ter relações plenamente comprovadas cientificamente com outros elementos físicos que também geram atração aos seres humanos, a definição renascentista é invariavelmente contestada por cientistas e pela sociedade.

É possível gostar do que é feio, amargo ou assustador – dessa forma, não seria o gosto que definiria o que é belo. O debate pela resposta do que consideramos feio ou bonito é pertinente e tem maior conexão, primordialmente com determinadas características, tanto visíveis quanto biológicas, nos objetos e seres, ao invés de seleções pré-estabelecidas ou uniformizadas do conceito.

A linguagem auditiva, verbal e fisiológica como complementação da imagem no processo da atração física humana.

Apaixonar-se, flertar ou manter relações sexuais e afetivas com uma pessoa pode parecer uma atividade sobretudo visual, com trocas de olhares e análise física do perfil de um indivíduo. Mas a voz, assim como a linguagem verbal e auditiva, também desempenha um papel importante no jogo de sedução e atração entre um ou múltiplos parceiros.

De acordo com a hipótese de Cláudio Munayer David (2006, p. 107-112) em A musicalidade da fala – o objeto sonoro em Freud, “a linguagem verbal e a musical são códigos de comunicação originados da mesma forma de qualificação dos afetos. Dar forma aos sons na música tem o mesmo significado tranquilizador que encontrar a palavra adequada para expressar um afeto ou uma impressão. Os sons compartilhados dentro de uma cultura se transformam, em grande parte, nas representações de palavras; outros, em representações musicais; alguns ainda permanecem diretamente ligados à satisfação do afeto pela descarga pura”.

Ele ainda explica que os sons da fala que escapam à representação da palavra interferem na semântica do discurso e do pensamento, em um constante jogo pela busca da satisfação do desejo. “Algumas dessas representações podem ser traduzidas pela lógica própria da linguagem musical. O som de uma voz pode conter uma enorme riqueza de importantes informações biológicas e sociais.”

Em pesquisa publicada no portal Plos One, a explicação para nossas atrações por vozes, por exemplo, tem a ver com o tamanho do nosso corpo. O estudo feito na Universidade de Londres examinou as preferências de trinta e dois voluntários e concluiu que a voz feminina aguda é considerada mais atraente e indica que a mulher é pequena.

No entanto, vozes masculinas mais graves foram consideradas as preferidas entre as mulheres e transmitem a informação de que os homens têm corpos maiores e mais atraentes. No caso das vozes masculinas, o que as torna ainda mais agradáveis é o tom da voz que, se for levemente sussurrado, transmite segurança e demonstra que os homens não são violentos, apesar de terem vozes mais graves.

Os pesquisadores garantem que esse tipo de estudo ajuda a compreender melhor os processos de atração e de busca por um parceiro ideal. Em relação ao som, já se sabe que o mesmo processo de seleção ocorre entre pássaros e mamíferos.

Já o fato de os homens preferirem mulheres menores, e a figura feminina, o oposto, a característica está ligada ao dimorfismo sexual, que exibe diversidades entre os parceiros. Essa preferência pelo que é diferente está diretamente associada a processos evolutivos.

A manipulação da fala feminina sugere que, ao alterar o tom de voz, há implícito um comportamento aprendido com base em estereótipos sexuais, em vez de características vocais reais de atratividade. “Quando uma mulher baixa naturalmente a sua voz, isto pode ser percebido como uma tentativa de soar mais sedutora e atraente e, portanto, serve como um sinal de seu interesse romântico,” afirma Dra. Susan Hughes (2001), da Universidade de Reading, na Inglaterra, em seus estudos.

Representações sonoras também reproduzem padrões que os sinais verbais, muitas vezes, não conseguem, ainda mais quando dinamizam lembranças afetivas. Quando pensamos nossas próprias ideias, utilizamos imagens sonoras da nossa própria fala. Podemos representar uma pessoa no pensamento pelas qualidades de sua voz. Da mesma forma, se estivermos escrevendo uma declaração de amor, pensaremos em imagens sonoras suaves e atrativas. (DAVID, 2006, p.107-112).

A música alcança efeitos psíquicos que ultrapassam delimitações estéticas por variações de timbre, tonalidade, ritmo, intensidade e acentuação, compondo a fala, a dança e o canto como formas adicionais de sedução.

A percepção auditiva desperta precocemente a atenção, originando uma imagem sonora capaz de lembrar o desprazer e, simultaneamente, reativar a experiência de prazer. O grito, que tem a sua fonte numa excitação corporal, acaba por suprimir a tensão interna ao exigir a realização da ação específica e reativando estados de desejo. (DAVID, 2006, p. 107-112).

Dessa forma, é possível pensar na conjectura de que as representações sonoras são as formas mais arcaicas na ontologia humana – ligadas desde o nascimento até a pulsão.

Em se tratando de questões olfativas e biológicas, geralmente a eleição de uma pessoa para envolvimento afetivo pode acontecer pela busca de um sistema imunológico incompatível e diferente daquele do parceiro, promovendo uma variedade genética maior. O desejo pode ser transmitido e buscado literalmente pelo gosto (saliva) e cheiro de alguém.

Certos hormônios e neurotransmissores são diretamente responsáveis pela química entre duas pessoas. A feniletilamina, neurotransmissor, pode comandar o poder de atração. Já o primeiro estímulo que temos quando vemos alguém é registrado pelo diencéfalo, parte do cérebro que identifica a imagem da mesma espécie. O som da voz e os feromônios, odor liberado por homens e mulheres, provocam a atração física.

De acordo com Álvaro Ottoni (2001), em entrevista para a Superinteressante, “a visão apurada do homem é um luxo evolutivo quando comparada com a de outros animais. É possível que nossa visão privilegiada seja uma compensação pelo olfato humano, que é bem limitado se comparado ao de outros animais. Já entre os humanos, se você trocar um recém-nascido por outro com os mesmos traços físicos, a mãe não irá reconhecer a diferença e muito menos rejeitar o bebê que não é seu pela diferença de cheiro.”

Portanto, os estímulos visuais, olfativos e auditivos fazem com que se ativem a feniletilamina e também a dopamina – que garante a sensação de prazer e bem-estar – e a ocitocina – conhecida como hormônio da paixão e do amor, provocando uma sensação de aconchego ao toque ou carícia.

Parte-se da conclusão de que sentir-se olhado não é um aspecto biologicamente neutro, em que a imagem é a única responsável. O organismo responde com diversas reações de alerta a um estímulo do parceiro. O coração se acelera, as glândulas sudoríparas secretam suor, mostrando assim uma ativação biológica múltipla daquele que se sente observado e admirado.

Estudos sobre fotogenia: a imagem pela busca da perfeição estética e pela notoriedade social e consumista

A palavra “imagem” pode ser analisada como a representação visual de um objeto ou ser, assim como uma reprodução da mente de uma sensação produzida por ela. Essa interpretação mental, consciente ou não, é formada a partir de vivências, lembranças e percepções e é possível de ser modificada por novas experiências e, consequentemente, por novas imagens.

Rose de Melo Rocha (2006) em Cultura da Visualidade e Estratégias de (In) Visibilidade defende a ideia de que “falamos, produzimos, consumimos e vivemos cercados por imagens. Imaginamos imagens. Criamos imagens. Até mesmo transformamos imagens imaginadas em concretas representações. Somos capazes de sonhar com nossa própria imagem. Algumas delas seriam pura simulação.”

Já a dúvida sobre a própria imagem e o que ela representa para o indivíduo e para o outro podem ser algo habitual. “Os espelhos são testemunhas pouco fiéis e sem perspicácia, porque invertem as falhas da nossa simetria, que têm uma função decisiva na expressão.” (EPSTEIN, 2011).

Indagações que o reflexo no espelho nos traz podem variar entre: “Este (a) sou eu mesmo?”. “Como posso parecer tão bela aos meus olhos e tão indesejável aos dos outros?”. (Ou o efeito vice-versa?). “Sou muito melhor (ou pior) do que esta imagem que vejo!” Entre as indagações, uma delas tornou-se a célebre frase do conto de fadas Branca de Neve e os Sete Anões: “Espelho, espelho meu, existe no mundo alguém mais bela do que eu?”.

Talvez seja por esse incessante anseio de parecer sempre mais belo ou sofrer de males e disformismos da aparência que a imagem acabou por flexionar-se em moldagem e adaptação mais fáceis e abundantes – seja por meio de cirurgias corporais e tratamentos estéticos e até pela fotogenia, que oferece opções na interação de cores, sombras, ângulos, figurino, maquiagem e outros artifícios, em que o objeto fotografado e a imagem revelada são, em grande parte, belas, imutáveis e perenes aos olhos dos que possuem dúvidas sobre a própria imagem refletida no espelho.

Tudo que engendra ou gera a luz é fotogênico, e a modalidade é uma espécie de dispositivo exclusivo da fotografia e do cinema, utilizando-se de técnicas de iluminação, impressão e tiragens distintas.

Outro objetivo da fotogenia seria o de mostrar (caso ele não exista naturalmente) ou o de criar (mesmo que de forma artificial e efêmera) um encanto, muitas vezes ausente da realidade fotografada, que pode acontecer pela falta de atrativos do ser ou, mais certamente, pelo medo e receio do fotografado em mostrar seus atributos, que terão seus motivos identificados mais tarde nesse texto.

A fotogenia veicula um anseio estético de não apenas revelar algo, mas o de esconder, podendo levar-nos a sentir algo além da identificação e da objetivação práticas, elevando-nos, enaltecendo-nos e encantando-nos a um estado de afeto íntimo, subjetivo e sublime.

Se há uma ausência, ora do que vejo e ora do que não vejo, seja por motivos propositais de luz ou sombra decididos pelo fotógrafo, ou pela falta do que se revelar, esse duplo sentido possui valores que acabam por assegurar a presença do que falta. Porém, aquele ou aquilo que vemos já está modificado pelas escolhas, edições e alterações que a câmera fotográfica ou o fotógrafo proporciona.
De forma graciosa, espontânea e até não premeditada, a fotogenia natural, ou seja, sem procedimentos e alterações estéticas seria a aptidão de revelar algo particular e belo das pessoas, objetos e mundo; uma capacidade de reinvenção e olhar sob um novo prisma; a reinauguração de sensações como a atração, a confirmação e a segurança do que é bonito e o encantamento a partir da imagem registrada, sem processos extremos de montagem, influenciando a poesia da imagem.

Engana-se quem pensa que seres considerados “feios” ou “pouco atrativos esteticamente” perante a sociedade não podem ser fotogênicos. O medo e o desconforto podem estar entre as principais causas da opressão que a lente pode ter sobre o modelo. Isso porque a maioria das pessoas perde boa parte de sua espontaneidade na hora do tão esperado clique. Portanto, a fotogenia é uma habilidade, e, como toda habilidade, deve ser exercitada.

Certos elementos podem influenciar a resolução e estética de uma foto: a luz do ambiente, os objetos dispostos em cena, o comportamento e a química entre fotógrafo e modelo, a edição final da imagem, ou outros fatores de sensibilidade técnica, como a utilização de lentes, câmeras e equipamentos específicos.

Com relação ao ângulo do rosto de um modelo, Rodrigo Desider Fischer (2012) afirma que, segundo as considerações do filósofo francês Gilles Deleuze, “o rosto é uma placa nervosa que sacrificou o essencial da sua mobilidade global e que recolhe ou exprime ao ar livre todos os tipos de pequenos movimentos locais que o resto do corpo mantém habitualmente escondidos”.

O retrato, então, exibe, essencialmente, mais o nosso interior do que o exterior, revelando total visibilidade por meio de uma aparência induzida e transformada que a realidade não nos atribui, ou, talvez, que ainda não conseguimos perceber ou aceitar como fotogênica e bela pelos outros.

Tantas distorções, visões e manipulações do real podem levar ao questionamento da autenticidade de uma imagem, aqui explicada no texto “A Imagem Autêntica”, de Hans Belting. Essa pergunta se coloca desde a existência da fotografia, que já prometia uma resposta, garantida por uma técnica objetiva. De acordo com Belting (2006), se tiver que haver imagens, elas que mostrem a verdade. O efeito de ilusão e do imaginário do belo subitamente se inverte, onde a mesma pessoa que constrói uma realidade alternativa para a própria aparência perante si mesma e ao próximo, também critica a falsidade da imagem produzida.

Procuramos na produção de uma imagem aquilo que gostaríamos de ter e de ver com nossos próprios olhos, e, quando isso não nos é revelado, exigimos novas imagens ou a reestruturação delas para podermos realizar nossos desejos e anseios de aceitação e amor próprio.

No conceito de autenticidade, é indicada uma realidade que muda constantemente a nossa expectativa de graça, aceitação e alacridade diante das imagens. Por isso, sonhar, pedir, e esperar por uma imagem esteticamente perfeita pode gerar expectativas frustradas a partir do momento em que não se encontra um conteúdo relevante ou genuinamente belo.

O que sobra é a desilusão e o afastamento. Uma vez abalada a fé em uma imagem, ela pode se transformar em um signo, atribuindo um grau de observação da realidade, supostamente livre de interpretações ou deformações, mas considerado ainda mais arriscado ou sedutor para alguém, por um maior sentimento de frustração, caso ele não atenda às necessidades de quem o observa.

O escritor francês Guy Debord (1997) declara que a sociedade atual “prefere a imagem à coisa, a cópia ao original, a representação à realidade e a aparência ao ser”. Ele considera que “a ilusão é sagrada, e a verdade é profana. O sagrado aumenta à medida que a verdade decresce e a ilusão cresce, a tal ponto que o cúmulo da ilusão fica sendo o cúmulo do sagrado”.

A obsessão do espectador pelo objeto ou por si próprio é assustadora: quanto mais ele contempla o irreal, menos vive fatos reais; quanto mais se envolve por imagens manipuladas em estéticas dominantes de necessidade de aceitação, menos compreende sua própria existência, individualidade, identidade e ambições.

Inevitavelmente, a busca por uma aparência perfeita, resultante de uma imagem alterada e, por vezes, oca, mais o desejo de aceitação e de visibilidade como fatores integrantes de sucesso e de popularidade são vistos comumente nas sociedades e mídias contemporâneas. A transformação do corpo humano se torna alvo de sonhos que nunca farão jus à realidade.

A fotografia manipulada, a cirurgia estética em busca de padrões de beleza que precisam ser em todo momento preenchidos, mas também questionados, e promessas de uma vida nova e iluminada vão ao encontro do desejo de outra aparência, fazendo com que isso se torne uma necessidade física irremediável. A imagem idealizada leva as pessoas a desejarem “forjar um conceito estético falso de si mesmas e viver esteticamente em outro”, como afirma Fernando Pessoa .

Essa relação de aparência com a câmera e a apreensão da luz é um caso particularmente interessante. Aqui não se encaixa avaliar o perfil do modelo fotográfico, do artista, a magnitude de uma posição corporal, o jogo de expressão facial ou a beleza natural e incontestável do objeto ou ser retratado.

A estética proposta, nessa circunstância, adquire a função de suprir uma desmedida vontade de visibilidade por aqueles que buscam serem vistos de maneira única – a superfície modificada da imagem visa nada mais do que o olhar de todo um coletivo ávido por notoriedade, contemplação e pelo consumo de ter algo belo e excepcional ou mesmo aparentar ambos.

Pela visão do escritor e filósofo Walter Benjamin, a influência das imagens fotogênicas e suas consequências terminam revolucionando a nossa percepção visual. Edgar Morin complementa que “as nossas percepções são trabalhadas e confundidas pelas nossas projeções”. (Apud XAVIER, 1983, p. 146).

Trata-se de uma mudança causada pela imagem e, sobretudo, pela imagem cinematográfica, que torna o universo mais próximo do homem: ao ver uma fotografia na tela do cinema, o espectador percebe-a como sendo a sua própria realidade. Portanto, a imagem e, mais ainda, seu reflexo, encontram na fotogenia o conteúdo ideal de toda transformação perseguida e cultivada.

De acordo com Raquel Fonseca (2010), “a fotogenia multiplica formas de alteração da imagem por um “brilho extra”, que destaca o corpo oferecido a todos os olhares. A abundância de imagens, hoje, é a prova de uma visibilidade que parece reforçar a ideia da fotogenia como o poder de iluminação. Tecnologia e ciência garantem a fabricação do corpo e do seu renascimento através desta luz tão desejada.

A sociedade pede por um distanciamento e desvinculação do corpo físico e de relações afetivas mais concretas e profundas, em que a predominância é a ostentação e a veneração de imagens virtuais (vistas incessantemente na internet e em redes sociais), assumindo certa banalização da importância do corpo para o próprio indivíduo em questões relevantes.

Tratando-se de questões éticas e morais frágeis, exploradas em um culto e construção da beleza para fins lucrativos, prestigiando um efeito de poder e de dominação sobre um objeto, produto ou ser retratados, tal banalização se torna uma grande vitória; uma procura de modismos iminentes a serem seguidos e compartilhados com um restante comum.

A ritualização e a simbolização de um mercado, a sociedade do espetáculo e de aparências questionáveis, misturam-se cada vez mais com o desenvolvimento tecnológico, deslocando a constituição básica e tão essencial à formação humana do saber e do sentir, para o ter e mostrar. Talvez seja essa a razão pela qual os olhos se fecham quando o que se quer ver é o próprio desejo, livre e longe de alterações, submissões e interesses mundanos árduos de serem ignorados e/ou contestados.

Referências

BELTING, Hans. A Imagem Autêntica. UFRGS. Maio 2006.

CAVALCANTE, Rodrigo. Beleza pura: A ciência está provando que a beleza é um conceito bem menos flexível do que imaginamos. Pesquisas revelam que já nascemos com ideias bem definidas sobre o que é bonito e o que é feio. SuperInteressante, São Paulo, jan. 2001. Comportamento-Conceito. Disponível em: <http://super.abril.com.br/ciencia/beleza-pura-441872.shtml>. Acesso em: 28 ago. 2014.

DAVID, Cláudio Munayer. A musicalidade da fala: o objeto sonoro em Freud. Reverso [online]. 2006, vol.28, n.53 [citado 2014-09-05], pp. 107-112. Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-73952006000100016&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em: 20 ago. 2014.

EPSTEIN, Jean. Fotogenia do Imponderável. Tradução de Maria Irene Aparício. Arte Ciência.Com, ano VII, n.14, set. 2011. Disponível em: <http://www.artciencia.com/index.php/artciencia/article/view/41/131>. Acesso em: 06 set. 2014.

ETCOFF, Nancy. A Lei do Mais Belo: a ciência da beleza. Tradução: Ana Luiza Borges de Barros. 1ª. ed. São Paulo: Objetiva, 1999.372 p.
FISCHER, Rodrigo, Desider. Investigações sobre fotogenia: produção de afetos no cinema de John Cassavetes. Rumores, ed.11, ano 6, n.1, jan. – jun. 2012.
FONSECA, Raquel. A fotogenia como fundamento do desejo de transformação da aparência. Porto Arte, Porto Alegre, v. 17. n.28, maio 2010.
GEREMIAS, Daiana. Por que nos sentimos atraídos pela voz de quem é do sexo oposto? Mega curioso, Paraná, maio, 2013. Ciência. Disponível em: <http://www.megacurioso.com.br/ciencia/36416-por-que-nos-sentimos-atraidos-pela-voz-de-quem-e-do-sexo-oposto-.html>. Acesso em: 28 ago. 2014.

GUY, Debord. A Sociedade do Espetáculo. 1ª. ed. Rio de Janeiro: Contraponto, 1997. 240 p.

HUGHES, Susan. People ‘lower voices to attract the opposite sex’. The Telegraph, Inglterra, maio. 2010. Science News. Disponível em <http://www.telegraph.co.uk/science/science-news/7749238/People-lower-voices-to-attract-the-opposite-sex.html>. Acesso em: 05 set. 2014

Human Vocal Attractiveness as Signaled by Body Size Projection. Plos One, abr. 2013. Disponível em: <http://www.plosone.org/article/info%3Adoi%2F10.1371%2Fjournal.pone.00062397>. Acesso em 20 ago. 2014.

O som da sedução: voz feminina indica interesse ou infidelidade. Diário da Saúde, jun. 2010. Disponível em: <http://www.diariodasaude.com.br/news.php?article=seducao-voz-feminina-indica-interesse-infidelidade&id=5327>. Acesso em: 28 ago. 2014.

ROCHA, Rose de, Melo. Cultura da Visualidade e Estratégias de (In) Visibilidade. Trabalho apresentado ao Grupo de Trabalho “Comunicação e Cultura”, do XV Encontro da Compós, UNESP, Bauru, SP, jun. 2006.

SILVA, Josimey, Costa da. A imagem como conhecimento: o corpo, o olhar e a memória. 10º Encontro Anual da Associação Nacional dos Programas de Pós- Graduação em Comunicação. ENAP. Brasília, 29 maio a 1 jun.

Som da voz e cheiros provocam atração física entre as pessoas. Portal G1, São Paulo, jun. 2012. Programa Bem Estar. Disponível em: <http://g1.globo.com/bemestar/noticia/2012/06/som-da-voz-e-cheiros-provocam-atracao-fisica-entre-pessoas.html>. Acesso em: 28 ago. 2014.

VALE, Lúcia de Fátima do. A Estética e a Questão do Belo nas Inquietações Humanas. Espaço Acadêmico, Paraná, n. 46, mar. 2005. Disponível em: <http://www.espacoacademico.com.br/046/46cvale.htm>. Acesso em: 20 ago. 2014.

WERNER, João. Conceito estético do “Belo”. Aula de Arte, Paraná. Estética. Disponível em: . Acesso em: 28 ago. 2014.

Fonte: OUTRAS PALAVRAS

"A luta de classes na China: entrevista com Ralf Ruckus" (PASSA PALAVRA)

PICICA: "Investigador independente, Ralf Ruckus é autor e tradutor de diversos artigos e livros sobre a composição social e política das lutas sociais na China, país onde realiza uma grande parte da sua pesquisa."

A luta de classes na China: entrevista com Ralf Ruckus


Investigador independente, Ralf Ruckus é autor e tradutor de diversos artigos e livros sobre a composição social e política das lutas sociais na China, país onde realiza uma grande parte da sua pesquisa. Entrevista por Passa Palavra.

Passa Palavra (PP): Quando é que começaste a interessar-te mais pelos desenvolvimentos ocorridos na China?

Ralf Ruckus (RR): Por meados da década de 90, veio a tornar-se evidente a deslocalização do centro da produção capitalista para a China, sem que muito se soubesse acerca das lutas que lá ocorriam e do seu contexto político e económico. À altura, alguns membros da revista política alemã Wildcat começaram a recolher informações sobre as lutas na China, na Indonésia e noutras regiões da Ásia. Em finais da década de 90, eles escreveram um artigo a sublinhar a importância da aprendizagem de línguas asiáticas e da criação de laços diretos com trabalhadores e ativistas de lá. Foi aí que considerei, pela primeira vez, centrar-me na questão da China.

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Posteriormente, no início dos anos 2000, uma parte de um círculo que se desenvolveu em torno da Wildcat começou a discutir a corrente dos estudos do sistema mundial mais orientada para a luta de classes, em particular a obra Forces of Labor (2003), de Beverly Silver, que publicámos em alemão, mas também outros autores, como Giovanni Arrighi. A meu ver, tais obras contribuíam com novos conceitos para a análise do capitalismo global e da recorrente trajetória de industrialização, migração, proletarização e luta de classes nos novos centros do desenvolvimento capitalista. No seu livro, Beverly Silver defende que, face à industrialização em massa da China na década de 90, é provável que o novo epicentro da luta de classes venha a surgir neste país. Com esta ideia em mente, comecei a aprender a língua e fui para a China.

PP: Como se desenvolveu a tua experiência na China? Estabeleceste contactos com trabalhadores e encontraste outras pessoas com perspectivas idênticas?

RR: Tanto eu como outros camaradas desenvolvemos relações próximas com ativistas e trabalhadores em várias cidades chinesas, bem como fazer entrevistas, reunir dados, etc. Foram tempos empolgantes, com novas perspectivas e visões, discutidas e sintetizadas numa brochura que publicámos em finais de 2007. Esta incluía artigos sobre a “velha e socialista” classe operária, a classe trabalhadora migrante, os camponeses, a China no sistema mundial etc.

Pouco tempo depois, traduzi o primeiro livro a partir do Chinês, uma compilação de histórias de vida de jovens trabalhadores migrantes das zonas económicas especiais do Sul da China, com um enfoque especial na exploração do trabalho e na opressão patriarcal das mulheres. Ao longo destes anos, durante as nossas visitas habituais à China, verificámos como a experiência das lutas conduziu a uma composição mais organizada de trabalhadores, com uma série de ativistas a surgir das greves e uma circulação de experiências e de saberes de luta. Procurámos assimilar estes processos e contribuir para a sua circulação no exterior. Foi assim que o Gongchao se formou. Inicialmente, estava apenas planejado ser um site de divulgação de livros e brochuras, mas acabou por se tornar numa espécie de arquivo de artigos em circulação sobre a luta de classes na China.

PP: Podes falar-nos um pouco mais do Gongchao?

RR: O site começou por ser em alemão. Pouco tempo depois, por razões óbvias, acrescentámos o inglês. Com o apoio de camaradas de diversos países, viemos a traduzir artigos e livros para outras línguas: polaco, eslovaquo, espanhol, françês, italiano, português, grego. Infelizmente, existem poucas iniciativas semelhantes a concentrarem-se nas lutas sociais na China, o que explica a atenção e o apoio que temos.

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Existem pessoas da Europa, América do Norte e Ásia a contribuir, o que faz do Gongchao, não um grupo localizado numa cidade, mas uma rede coletiva de camaradas oriundos de várias regiões que partilham de posições anti-autoritárias e de métodos de pesquisa e intervenção política. Alguns participantes têm ligações a universidades, sendo que (re)publicamos artigos «científicos», caso estes disponibizem informação e análise relevantes. Mas, em geral, o quadro académico tende a ser demasiado estreito e tendencioso. A nossa pesquisa e intervenção baseiam-se no debate e na decisão política.

PP: Podes resumir o padrão das lutas operárias na China ao longo da última década?

RR: O padrão de luta dos trabalhadores migrantes alterou-se, uma vez que, antes de 2003, estas tendiam a ser raras, pequenas, isoladas, baseadas em relações de parentesco e defensivas nas suas reivindicações. A partir desta altura, tornaram-se mais frequentes, maiores, contagiosas, baseadas num interesse de classe e ofensivas nas suas reivindicações. Enquanto a primeira geração de migrantes, da década de 90, era composta por pequenos camponeses que queriam regressar às suas aldeias após alguns anos de trabalho na cidade, uma grande parte da segunda geração, dos anos 2000, não pode mais cultivar terras. Pelo contrário, pretende permanecer na cidade, tendo acumulado as experiências e os saberes suficientes para lutar pelo seu próprio interesse – um padrão observado ao longo de outras fases de súbita industrialização e proletarização de migrantes ocorridas noutros tempos e noutras regiões do mundo.

PP: Qual achas que será a resposta do Partido Comunista Chinês (PCC) à crescente agitação laboral? E a do capital privado?

RR: O PCC sabe que não pode simplesmente colocar uma tampa sobre o descontentamento dos trabalhadores, sendo obrigado a libertar algum vapor. A partir da década de 90, o PCC implementou algumas leis de trabalho e de negociação coletiva, de forma a canalizar algum do descontentamento para procedimentos institucionais. Tal conduziu ao aumento do número de casos jurídicos, sem que, contudo, se tenha conseguido parar o aumento de outras formas de lutas «selvagens», ilegais na China: greves, manifestações, bloqueios de estrada, etc. No entanto, o PCC recorre igualmente à força na supressão de lutas, quando estas adquirem uma maior dimensão ou colocam em causa o seu domínio. Eles reprimem e prendem ativistas, recorrem à polícia de intervenção para desbloquear as estradas e intervêm dentro dos locais de trabalho.

PP: Achas que o modelo de desenvolvimento da China das últimas décadas poderá vir a entrar em crise?

RR: Existem dois tipos de «perigo», um externo e outro interno. A crise de 2008 provocou o encerramento de fábricas e o aumento de desemprego na China, até o momento em que o PCC e governos de outros países decidiram intervir através de massivos programas de fomento. Contudo, e dado que os problemas que conduziram à crise global de 2008 não foram resolvidos, poderemos vir a assistir a uma nova recessão, sendo que não é claro até que ponto é que os EUA, os países da UE e China seriam capazes de imprimir o dinheiro necessário a uma nova série de planos de fomento públicos.

O desenvolvimento das lutas dos trabalhadores é igualmente relevante. O seu aumento conduziu a salários mais elevados na China, cerca de 10% a 15% nos últimos 10 anos. Caso esta tendência persista, o modelo de «trabalho barato», a base do sucesso económico chinês, poderá chegar ao fim. O aumento do consumo interno poderá colmatar o declínio das exportações. Porém, não se sabe até que ponto é que o capital chinês e estrangeiro (localizado na China) serão capazes e estarão dispostos a permitir aos trabalhadores chineses a garantia, a longo prazo, de uma maior fatia da riqueza produzida. O declínio das exportações, seguida de desemprego e da estagnação salarial, poderá originar mais lutas e acionar uma ainda maior crise económica e social.

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PP: O que se pode esperar da classe trabalhadora chinesa nos próximos anos?

RR: O conflito de classe poderá vir a intensificar-se devido a problemas relacionados com a transição da economia de exportação chinesa e com a determinação dos trabalhadores chineses na luta por melhores condições, contra a exploração. Teremos que verificar a viabilidade dos mecanismos de canalização e de institucionalização dos conflitos laborais do PCC. Até agora, as lutas baseiam-se em formas de diversas de auto-organização. A pressão, desde baixo, é criada por uma onda de lutas que não é nem cooptada, nem integrada por sindicatos ou partidos reformistas.

Facções no seio do PCC, mas igualmente entre ONGs e «esquerdistas», pressionam no sentido de uma institucionalização das lutas laborais e de uma reforma dos sindicatos, ainda sobre o estrito controlo do PCC, com os seus representantes a serem rejeitados pelos trabalhadores. Veremos se a direção do PCC permitirá tais reformas do sindicato, de forma a obter mais uma ferramenta no controlo das lutas.

Mais importante, teremos que verificar a possibilidade de um eventual aumento, ainda maior, do número de lutas dos trabalhadores; da possível obtenção de mais concessões da parte dos trabalhadores; e, por fim, da sua capacidade de repelir tentativas de cooptação. Tal é difícil de prever.

PP: Achas que os investimentos capitalistas na China serão redirecionados para outras regiões no Mundo? Outros países asiáticos? Outros continentes?

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RR: Isso, de certa forma, já acontece. Algumas indústrias com reduzidas margens de lucros, altamente sensíveis aos aumentos salários na China – como a indústria de vestuário – deslocalizaram uma parte da sua produção para o Vietname ou Bangladesh. Todavia, não é provável que indústrias com elevadas margens de lucros e grandes grupos industriais o venham a fazer, uma vez que os salários chineses ainda são francamente reduzidos quando comparados com os da América do Norte e os da Europa Ocidental; uma vez que o mercado chinês continuará a ser importante para o capital global; e uma vez que não existem regiões alternativas, com uma infraestrutura semelhante, uma ampla e qualificada força de trabalho e uma relativa estabilidade política.

PP: Que tipo de impacto é que os atuais acontecimentos na China poderão ter no sistema capitalista mundial? E em que é isto influencia os trabalhadores da Europa e da América do Sul?

RR: A China é um ator global, cuja ascensão – à semelhança de outros «estados em vias de desenvolvimento», como o Brasil ou a Índia – veio alterar a balança do poder e do sistema mundial. Conforme atrás mencionámos, a China é o centro da produção global, em particular de produtos do consumo. O aumento dos salários, neste sentido, poderá significar o aumento dos preços destes produtos. Tal produziria efeitos em termos de preços, salários e, logo, de níveis de consumo de grande parte do mundo. Será interessante constatar a reação dos trabalhadores, por exemplo da Europa ou da América do Sul, face a salários cujo valor não permite a aquisição de telemóveis ou outros bens de consumo.

PP: Como podem os trabalhadores de outros países contribuir para as lutas dos trabalhadores chineses?

RR: Não estou certo de uma eventual contribuição direta. Contudo, acho vital o conhecimento da situação e das lutas dos trabalhadores na China, que compreendam não se tratar de «uma força de trabalho barata», mas de pessoas com interesses semelhantes que enfrentam o capital.

PP: Como podem os trabalhadores de diferentes partes do mundo estabelecer ligações e apoiarem-se mutuamente?

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RR: Há alguns anos atrás, esperámos que os movimentos das praças ocupadas e as greves que se espalharam entre 2009 e 2012 conduzissem a um movimento global. Tal não aconteceu (ainda), pelo que nos encontramos a atravessar um período menos promissor de refluxos políticos e guerras. Um dos obstáculos reside no facto de muitos movimentos dos trabalhadores ainda decorrerem no quadro do estado-nação. Em muitos países, até a grande parte das facções de esquerda ainda se concentra no «seu» país, não conseguindo ultrapassar um «internacionalismo» datado no quadro de instituições e organizações.

Além do desenvolvimento de lutas locais, é essencial a criação de maiores ligações diretas entre trabalhadores e ativistas, a aprendizagem de linguagens estrangeiras, a circulação de mais informação produzida «desde baixo», etc. Possuímos todos os meios técnicos e capacidades para organizar tais trocas. Mas o número de pessoas dedicadas a tal, em particular com ligação à Ásia, é demasiado reduzido. Maiores ligações diretas e fluxos de informação – sem o filtro e a distorção dos media burgueses, das estruturas sindicais e das direções das ONGs – poderão compor a base de apoio mútuo dos movimentos – isto é, quando a maré mudar de direção e verificarmos uma nova dinâmica de lutas sociais a uma escala global.

A entrevista foi ilustrada com obras de Zeng Fanzhi.

novembro 29, 2014

"15M das eleições, entrevista com Javier Toret, de Barcelona", por UniNômade

PICICA: "A UniNômade entrevistou por skype o pesquisador Javier Toret, de Barcelona. Com um trabalho teórico sobre tecnopolítica de redes ativistas do 15M, colaborador de Manuel Castells no “Internet Interdisciplinary Institute” (IN3/UOC), Javier participou intensamente dos processos de discussão e articulação do movimento do 15 de Maio e seus desdobramentos nos anos seguintes. Em 2011, sob o contágio das primaveras árabes e Praça Tahrir, o 15M foi uma ventania de acampadas, organizações de bairro e mobilização pelas redes sociais, marcando o início de um novo ciclo de lutas em meio à crise da representação política e econômica na Europa. Três anos depois expressões do 15M ganharam o noticiário, articulando o desejo de mudança e a vontade de participação em partidos de novo tipo com aspirações eleitorais, como o Podemos, que rompeu com o bloco da “casta política”, um bloco unitário apenas simbolicamente dividido entre “esquerda” (PSOE) e “direita” (PP).
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Depois, nasceu o Guanyem (“Ganhemos”, em catalão), que se organizou a partir de pessoas ligadas a movimentos sociais, na franja do 15M, na cidade de Barcelona. Nesta entrevista, colocamos algumas perguntas a Javier, que respondeu como pesquisador e participante dessas dinâmicas, a respeito do funcionamento e da composição principalmente do Guanyem, abordando por tabela também o Podemos e outros grupos organizados espanhóis, como o Partido X, o Process Constituent (PC), o Iniciativa per Catalunha e los verdes (ICV) e a Esquerda Unida (IU)."

15M das eleições, entrevista com Javier Toret, de Barcelona

Por UniNômade, em 27/11/2014

A UniNômade entrevistou por skype o pesquisador Javier Toret, de Barcelona. Com um trabalho teórico sobre tecnopolítica de redes ativistas do 15M, colaborador de Manuel Castells no “Internet Interdisciplinary Institute” (IN3/UOC), Javier participou intensamente dos processos de discussão e articulação do movimento do 15 de Maio e seus desdobramentos nos anos seguintes. Em 2011, sob o contágio das primaveras árabes e Praça Tahrir, o 15M foi uma ventania de acampadas, organizações de bairro e mobilização pelas redes sociais, marcando o início de um novo ciclo de lutas em meio à crise da representação política e econômica na Europa. Três anos depois expressões do 15M ganharam o noticiário, articulando o desejo de mudança e a vontade de participação em partidos de novo tipo com aspirações eleitorais, como o Podemos, que rompeu com o bloco da “casta política”, um bloco unitário apenas simbolicamente dividido entre “esquerda” (PSOE) e “direita” (PP).
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Depois, nasceu o Guanyem (“Ganhemos”, em catalão), que se organizou a partir de pessoas ligadas a movimentos sociais, na franja do 15M, na cidade de Barcelona. Nesta entrevista, colocamos algumas perguntas a Javier, que respondeu como pesquisador e participante dessas dinâmicas, a respeito do funcionamento e da composição principalmente do Guanyem, abordando por tabela também o Podemos e outros grupos organizados espanhóis, como o Partido X, o Process Constituent (PC), o Iniciativa per Catalunha e los verdes (ICV) e a Esquerda Unida (IU).

Guanyem
O Ganhemos surgiu em Barcelona com o objetivo imediato de ganhar as eleições municipais de 2015. Como é articulada essa dinâmica local, perpassada pela questão da autonomia da Catalunha, e o desejado efeito multiplicador das novas plataformas?
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O Guanyem Barcelona nasceu num contexto de crise geral do estado espanhol, enredado em tramas políticas de corrupção. Ele surge num cenário político de desdobramento-mutação do 15M. Em parte, se articula como um projeto municipal para Barcelona, com questões do contexto catalão. Outra parte é o grupo organizado na Plataforma dos Atingidos pelas Hipotecas (PAH), uma luta contra os despejos, remoções e carestia da moradia. E muitos grupos mais. O Guanyem incorpora tanto ativistas que se conhecem desde o movimento alterglobalização dos anos 1990 e 2000, e também grupos mais vinculados à política local dos bairros. Têm pessoas não muito imbricadas nos movimentos, mais ligadas a uma concepção cidadanista, e ativistas que já atuam há muitos anos e participam de movimentos organizados, mas também muitos cidadãos que estão dando um passo a frente para implicar-se diretamente num novo projeto de cidade para Barcelona. Guanyem é um híbrido. A principal porta-voz do Guanyem é Ada Colau, que tem a capacidade de reunir essa composição no projeto voltado às eleições municipais de maio. É um projeto desde baixo, de viés transformador, que parte do mais local, um municipalismo constituinte. As eleições municipais da Espanha têm uma tradição de marcar momentos de mudança, basta lembrar aquelas de maio de 1931, que virou emblema numa frase famosa: “Espanha foi dormir monárquica e acordou republicana.” Com relação à Catalunha, vivemos uma situação especial que é a questão da relação dessa região autônoma com o estado espanhol. O Guanyem não se coloca nem contra nem a favor da separação, ele é a favor de ampliar o direito de decidir dos catalães, propõe a possibilidade de ser consultados a respeito do desejo de continuar ou não integrados à Espanha, mas também Guanyem está a favor do direito de decidir em muitos temas e assuntos. Guanyem quer devolver as instituições à gente.

O Ganhemos é, então, eleitoralista? Esse é o foco?

Sim, o Guanyem é um processo coletivo de participação voltado a construir uma candidatura vencedora para a prefeitura de Barcelona. Sua declaração de intenções é clara: ganhar as eleições. Mas ganhar, aqui, não é simplesmente ganhar a eleição. É disparar um processo de empoderamento cidadão, associado a dinâmicas de mobilização social e construção de contrapoder. Tem como objetivos concretos acabar com a desnutrição infantil, recuperar os direitos básicos (água, moradia, educação etc). Como eu disse, é um projeto eleitoralista com um fundo de municipalismo constituinte. O Guanyem acredita em garantir os direitos mesmo que tenhamos que desobedecer uma fração institucional do estado. O municipalismo constituinte é necessariamente plural. Hoje, o Guanyem comporta 16 agrupamentos de bairro e 6 grupos de trabalho, debruçados sobre 13 eixos temáticos. Essa organização permitiu fazer confluir pessoas que já estavam nas lutas pela moradia e direitos da cidade, tocando temas importantes dos coletivos e movimentos sociais — não todos, mas uma parte importante.

O Guanyem assume a pauta cidadanista, que a esquerda tradicional (na Espanha como no Brasil) gosta de desqualificar como antipolítica, discurso vazio anticorrupção e slogans mais morais do que políticos. Como o Guanyem articula a pauta cidadanista de maneira a fortalecer a luta por direitos, o vetor constituinte?

É um debate aberto, controverso, e posso falar a minha visão pessoal como pesquisador. O 15M mudou o eixo de coordenadas da ação política diante do estado espanhol. Mudaram as coordenadas, o 15M gerou uma reconfiguração do mapa de enfrentamento e dos posicionamentos políticos. O problema não é mais dividido entre “de esquerda” ou “de direita”, mas da gente, das pessoas, contra a casta política, os banqueiros, a máfia, as oligarquias, os negócios das grandes elites, em suma, contra o 1% que, governando, está levando o país ao desastre total. Em vez das divisões entre esquerda e direita, a percepção vai muito além. Depois do 15M, a polarização que se deu foi transversal em relação aos vários perfis sociais. Os companheiros do Podemos falam que a sociedade espanhola mudou o sentido comum com o 15M. O Guanyem também vai por essa direção, que não é mais ficar disputando a margem esquerda do tabuleiro. Teoriza-se muito sobre isso no Podemos, o Íñigo Errejón, por exemplo, a partir de uma reflexão gramsciano-laclauliana, situa o problema político como do populismo, da maneira de incorporar os muitos num processo conflitivo e inclusivo, articulador da disputa hegemônica.

E como o Ganhemos se estrutura, sua política de alianças, financiamento?

Desde a experiência do Partido X, passando pelo Podemos, até chegar no Guanyem, se tem uma cultura de fazer as coisas muito diferente nesse sentido. Baseada na transparência, numa abertura à participação muito diferente. O Podemos é um projeto que se lança sem se apoiar em aliança econômica alguma com grupos preexistentes. Mesmo os movimentos sociais, o Podemos não vai centrado em direção a eles, senão na construção de poder com o povo. Não se trata de acumular uma força social, e então dar uma expressão política e eleitoral. É um trabalho que gera um movimento em que outros podem confluir e onde pode acontecer uma recomposição de projetos distintos. O Podemos lança um movimento político, que joga e fala no terreno eleitoral, é uma força transversal, pega à esquerda e à direita. Obviamente tem riscos, mas é uma potência que nunca vimos antes no campo da representação, porque é um monstro entre o processo grandíssimo de articulação social e um partido de novo tipo. O Guanyem é um projeto que busca uma confluência de distintos atores, cidadãos, movimentos sociais e partidos políticos que estão pela mudança pra valer, pra mudar as regras do jogo. Com um forte protagonismo cidadão. Faz uma recomposição e busca a transversalidade sem propor nenhuma “frente de esquerda”. Hoje, o Guanyem trabalha com forças sociais e relações com outros grupos, como o Processo Constituinte (PC) e o Iniciativa por Catalunha (ICV) e Podemos de Barcelona. O financiamento se dá com várias campanhas crowdfunding, um financiamento distribuído e pessoal, de baixo custo, transparente na sua página na web.

E como foi a relação do Podemos, ou do Ganhemos, com a oposição de esquerda mais tradicional, agrupada na Esquerda Unida (IU)?

É um mapa complicado que depende de cidade pra cidade. O Podemos é uma estrutura en formação gigantesca, são 800 círculos ou grupos locais e temáticos, com gente associada e simpática ao projeto que se empoderou, além de ativistas mais antigos, em menor proporção. A Esquerda Unida está num momento de crise, luta interna e adaptação. Chegou a mudar seu candidato, colocando o Alberto Garzón, que tem 29 anos e vem do movimento 15M. A Esquerda Unida é muito estruturada, e em muitos sentidos superada pela situação. Podemos, em pouco tempo, já está cinco vezes maior em termos de potencial eleitoral e participação ativa diária das pessoas. A IU está dividida diante desse fenômeno, a parte mais avançada se aproxima do Podemos. Com alguns Ganhemos, houve conflitos, guerras políticas, e uma tentativa “entrista” de se apropriar das plataformas cidadãs, entrando em grupos articulados de fora para tomar os processo decisórios. Guanyem fez um pequeno guia de princípios que devem ser reconhecidos, a fim de evitar essas apropriações. No Podemos, também há tensões sobre isso, uma grande maioria nele não quer nem saber da Esquerda Unida, não quer fazer nada com eles. Houve um escândalo recente ligado a um Caja Madrid, relacionado a cartões de crédito, que não atingiu apenas os dois partidos principais (PP e PSOE), mas também a IU ou pessoas dos sindicatos.

Quais são as pautas consolidadas, ou pelo menos os indicativos, do Guanyem, por exemplo, sobre renda, aborto, imigrantes?

Esses conteúdos estão sendo discutidos agora, já que o Guanyem foi criado neste ano. Nada está fechado. Está em fase de definição. Em breve, devem sair posicionamentos ao redor dos treze eixos temáticos (sobre precariedade, sexualidade & gênero, urbanismo, direitos básicos etc). Aí serão formuladas as propostas e programas. Por outro lado, estamos usando uma plataforma de rede muito útil nesse processo de sondagem das prioridades cidadãs, que é o AppGree. É uma plataforma que permite encontrar as ideias em que haja acordo, numa comunidade de grande porte. Appgre não reduz as opções a duas ou três, ele permite que o usuário agregue outras posições, amplie a pergunta, desenvolva o tema. Os algoritmos pegam as respostas e montam grandes sínteses comuns, das posições discutidas tirando aquelas com maior ¨% de concordância. Isso é necessário quando você incorpora num processo de debate duas, cinco mil pessoas, cem mil pessoas. É preciso pensar essas tecnologias digitais como ferramentas não só de debate, mas pra transformar a estrutura da participação. A participação em rede é das dinâmicas mais importantes para a construção de pertencimento e subjetividade, para a intercomunicação, pra amadurecer o debate sobre como fazer, pra auto-orgaização midiática. Podemos e Guanyem são organizações multicamadas nos meios públicos, da TV às redes sociais às dinamicas e conselhos locais, e com essas técnicas articuladas entre si já ficou claro que podemos realmente vencer a casta. Na experiência do Podemos, no DNA dessas iniciativas está a experiência sul-americana: começa-se com um programa social-democrata, aposta-se baixo, sabendo que a batalha é grande e de longo prazo, mas mesmo assim se vai ao campo eleitoral para mudar a tendência e gradualmente avançar num processo constituinte. Toda aquela agitação do 15M, experiência e energia foram canalizadas, em uma parte importante, dessa maneira, nas eleições. É como um “15M no campo eleitoral”, que está agregando a ilusão coletiva de país.
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Entrevista e tradução por Bruno Cava.

Fonte: Universidade Nômade Brasil

"Brasil, junho e julho de 2013", por María Isabel Ackerley

PICICA: "La primavera árabe y la protesta de los indignados en España fueron acreditadas al poder de las redes sociales en Internet y ese entendimiento pautó el debate sobre la movilización social en Brasil. Bajo ese impacto se discutieron nuevas formas de activismo y se promovieron las movilizaciones en 2011 contra el aumento de la tarifa de ómnibus, contra la creación de una usina eléctrica en Belo Monte y por la legalización de la marihuana. Finalmente, las protestas en Turquía, iniciadas en la ciudad de Estambul el 28 de mayo de 2013, anclaron en Brasil.

El estallido del 2013 a partir de un reclamo por un aumento del precio del pasaje de ómnibus en São Paulo (20 centavos) suscitó una protesta que fue violentamente reprimida por la policía militar (PM). A partir de esto Brasil presenció una movilización social en las calles y un desdoblamiento de reclamos por derechos sin precedentes en el país que no cesan de desdoblarse y multiplicarse. Multitudes que exigen la transformación de los paradigmas establecidos, entre ellos, el de la democracia por una “democracia real”."

MÍDIA & SOCIEDADE

Brasil, junho e julho de 2013

Por María Isabel Ackerley em 04/11/2014 na edição 823

Publicación subvencionada por el Conicet (Consejo Nacional de Investigaciones Científicas y Técnicas). Este artículo se relaciona a la publicación “Tecnologías de comunicación y movimientos sociales” http://revistadefilosofia.com/53-03.pdf; texto em espanhol


La primavera árabe y la protesta de los indignados en España fueron acreditadas al poder de las redes sociales en Internet y ese entendimiento pautó el debate sobre la movilización social en Brasil. Bajo ese impacto se discutieron nuevas formas de activismo y se promovieron las movilizaciones en 2011 contra el aumento de la tarifa de ómnibus, contra la creación de una usina eléctrica en Belo Monte y por la legalización de la marihuana. Finalmente, las protestas en Turquía, iniciadas en la ciudad de Estambul el 28 de mayo de 2013, anclaron en Brasil.

El estallido del 2013 a partir de un reclamo por un aumento del precio del pasaje de ómnibus en São Paulo (20 centavos) suscitó una protesta que fue violentamente reprimida por la policía militar (PM). A partir de esto Brasil presenció una movilización social en las calles y un desdoblamiento de reclamos por derechos sin precedentes en el país que no cesan de desdoblarse y multiplicarse. Multitudes que exigen la transformación de los paradigmas establecidos, entre ellos, el de la democracia por una “democracia real”.

Trayectoria de movimientos sociales en Brasil

Brasil cuenta con una larga trayectoria de resistencias y movimientos sociales. Si nos remontamos en el tiempo, los quilombos devenidos en las actuales “comunidades quilombolas”, entraron en la agenda de las políticas públicas a partir de la Constitución Federal de 1988 donde el Estado les otorgó los títulos de propiedad de las tierras que venían ocupando. La resistencia que caracterizaba al quilombo era la autonomía, siendo que lo define el movimiento de transición de la condición de esclavo a la de campesino libre. Actualmente las comunidades quilombolas son agrupaciones de campesinos con actividades propias del campo (http://www.cpisp.org.br/comunidades/html/i_oque.html). Otro ejemplo de movimiento social es el MST (Movimiento de los Trabajadores Rurales Sin Tierra,) que nació en el período de 1970-85 como consecuencia de las relaciones socioeconómicas de ese período y el proceso de concentración de grandes extensiones de tierras, latifundios, en propiedad de pocos grupos de la sociedad, latifundistas. Esto dejó librados al azar a los pequeños propietarios que se empobrecieron y buscaron la manera de articular un movimiento para organizarse y luchar contra la concentración de la tierra y por la reforma agraria. Casi simultáneamente nace el PT (Partido de los Trabajadores) desde el sindicalismo espontaneo de operarios en São Paulo a fines de los años 70, representando al socialismo como forma de organización social. Su líder operario Luiz Inácio Lula da Silva, alcanzó la presidencia en el 2003. En el 2005 el partido tuvo un duro revés por el escándalo de las mensualidades, corrupción en la que estaban involucrados varios miembros del partido. También podemos resaltar la práctica de presupuesto participativo en Porto Alegre, capital de Rio Grande do Sul, desde 1989. Esta práctica de consulta y diálogo entre la comunidad y las autoridades quizá sean un punto de referencia clave para las exigencias de las movilizaciones actuales. Y por último, pero no en último lugar, recordar que Porto Alegre albergó al movimiento contra la globalización en el Foro Social Mundial (FSM).

A partir de ahora

En el documental A partir de agora – As jornadas de junho no Brasil, investigadores, profesores, activistas, artistas, periodistas, realizan un recorrido por los acontecimientos y analizan el estallido en 2013: los motivos y los despliegues hasta el presente y algunos se animan a pensar el futuro. Entre otros temas afirman la necesidad del pueblo brasileño de una nueva forma de política, idea que se profundizó y propagó con la ayuda de la herramienta digital Internet, la cual permitió comunicar, reunir, congregar y organizar las manifestaciones, como asimismo posibilitó la proliferación de medios que han viabilizado la producción y difusión de comunicación fuera de los circuitos tradicionales. Algunos comentarios: “Las personas son deliberativas y la Internet ayuda a que la sociedad aprenda a deliberar y a reunir millones de personas. El mecanismo de comunicación se realiza por Internet desafiando la comunicación tradicional”; “También y sobre todo es el sistema político el que está en juego”, y agregan: “La forma partido lleva ya 200 años y no dio resultado. Estas nuevas demandas harán que aquellos grupos que no se sepan permear de lo nuevo sucumban, porque ahora podemos construir nuevas vías de comunicación. Por esto es necesario salir de los esquemas establecidos, otro modelo político y esto es apasionante porque es imprevisible.” En cuanto a la economía, reconocen que aumentó el poder adquisitivo siendo que el 76% de la población activa gana hasta 3 salarios mínimos, pero también la tasa de lucro de los bancos es el más alto hasta ahora en la historia de Brasil. En este sentido hacen hincapié en que el aumento de renta no es lo que hace que se mejore, porque consumir más no significa mejor calidad de educación, de salud o de transporte. Para ellos todo indica que el PT ayudó a construir esa despolitización que creció en los últimos 10 años: “no es lo mismo gobernar para un sin techo que para un banquero”. Al mismo tiempo, denuncian a los medios de comunicación como enemigos de la población porque no estaban allí representando al pueblo, como por ejemplo lo hicieron en las “diretas já” (1983/4) y “Fora Collor” (1992) cuando se logró unidad. Y agregan: “Aquí no hay unidad, se abren nuevos espacios de disputa. Vamos a ver quién es quién: quien esta con el pueblo y quien está contra” [Publicación subvencionada por el CONICET (Consejo Nacional de Investigaciones Científicas y Técnicas). Este artículo se relaciona a la publicación “Tecnologías de comunicación y movimientos sociales” http://revistadefilosofia.com/53-03.pdf] (http://www.youtube.com/watch?v=3dlPZ3rarO0).

Dinámica entre red y calle

Veamos los motivos de la manifestación en directo a través de la red social Facebook [entre el 19 y 21 de junio del 2013, entre multitudinarias manifestaciones el profesor de la ECO-UFRJ, Doctor André Parente escribía los comentarios que cito en este artículo. En el período de las elecciones 2014, el Dr. André Parente apoya a la candidata del gobierno establecido-PT]:
“André Parente: Aqui vão cinco pontos que equivalem a uma reforma política:

1) ficha limpa;
2) voto aberto em todas as instâncias;
3) transparência das verbas de campanha;
4) fim das mordomias;
5) lei que impeça que um político possa ser dono de meios de comunicação.

Porque a reforma política é tão complicada? Porque cabe aos políticos fazerem a reforma. Imagina se dependesse dos empresários resolver os nossos problemas de distribuição de renda!”

Brasil, imperio esclavista de históricos acomodos, que entre boteco, samba y sol la gente va llevando. Gatopardismo mutante.

“André Parente: O nosso país deveria ter escrito em sua bandeira: capitania ou morte! Somos bisnetos das capitanias. Dela não saímos. As nossas capitanias são imensas e heterogêneas, são estados inteiros, ‘sistemas’ de transporte de metrópoles e estados, impérios de comunicação e de telecomunicação dominados por uma, duas ou três famílias...! Esta gente manda mais e tem mais dinheiro do que vários dos nossos governadores. Uma sanha concentracionária imperial. A nossa corte continua a mesma da época da colônia. Nada mudou. Ou melhor, tudo mudou apenas para que nada mudasse de verdade.”

¿Quién se atreve a afirmar que el detonante fueron 20 centavos? ¿Quién se atreve a negarlo?

“André Parente: Não quero acreditar que toda aquela gente estava lá apenas por 20 centavos! Queremos um sistema de transporte de verdade, com ônibus e não caminhão, com passe diário, semanal e mensal, com passe livre para os idosos e estudantes! Chega de maquiagem!!! Chega de fazer de conta!”

La corrupción en el centro y como eje de la problemática de la supuesta democracia:

“André Parente: Segundo a jornalista da Globo, só tinha 10 mil pessoas. E segundo o Jabor, só gente rica! Uma colega cineasta acha que por estarmos vivendo em uma democracia cada um pode achar o que quiser, mesmo a custa das mais descaradas mentiras. É como se não fosse mais necessário enxergar, escutar, ler, para emitirem opinião, ainda que seja num veículo de comunicação de massa de grande poder de audiência. Aliás, estas pessoas desta empresa devem ter parte nos negócios de transporte, porque estão dando sinais de reações mentais estranhas. Espero que não seja contagioso. Para eles, é apenas necessário que as coisas sejam como é preciso que sejam segundo seus interesses e pronto: eis a democracia. É como se o mundo fosse feito para cumprir os seus desejos e nada mais.”

La gente toma la calle porque el sistema expulsa a la calle. Mendigos deambulando en un mundo mercado. Zombis que “sobreviven” de la carroña sobrante.

“André Parente: O Brasil, o país mais caro do mundo, vem sendo sistematicamente saqueado pelos empresários e políticos (com a conivência da mídia). Não há transporte, educação, saúde ou moradia. O que fazer senão ir às ruas? A política brasileira virou um circo cafona e vazio! Eles são o verdadeiro crime organizado. Há uma insatisfação generalizada, isto sim! Queremos ser felizes, mas não apenas numa música da Bossa Nova, ou na imagem idealizada do Porto Maravilha!”

¿Acaso estos pensamientos/comentarios en plena manifestaciones de junio, julio 2013 en Brasil no son una misma voz en todo el mundo?

El Movimiento 15-M o “democracia real ya” en España también convoca manifestaciones multitudinarias a través de la red, bajo el lema no somos mercancía de políticos ni de banqueros, y con carteles que dicen “Esperanza, we hate you”. El primer objeto de sus críticas son los partidos mayoritarios sin excepción, a los que culpan de contribuir a la crisis y de no permitir la democracia real. Lo que está en juego es todo un sistema político-económico-social-judicial.

“André Parente: Eu prefiro calcular de outra forma. Um dos índices que atestam o desenvolvimento de um país é a percentagem que o estado gasta em termos de PIB. Seria importante calcular quanto do PIB os empresários, os políticos e lobistas levam a cada ano do estado, seja em corrupção, em subsídios, em vantagens diversas, em projetos sem interesse. Com certeza isto seria maior do que o que o Estado diz gastar com educação, saúde e transporte. Óbvio que mesmo nestes campos dito setores essenciais, somos roubados diariamente pelo mesmo empresariado, pelos seguros de saúde, por exemplo. O Brasil é o país mais caro não apenas pelo preço de nossos produtos e serviços, mas pelo fato de pagarmos tanto imposto e não termos retorno algum!”

“Você vai se acostumar”, es la frase-tipo de recepción a Brasil. El paisaje, la amabilidad, la música, se desdibujaban en el rostro de los que habitaban la calle, en el inframundo. ¿Candelaria 1993?
Con otras palabras, el profesor Muniz Sodré enfatizó el valor, todavía en crisálida, de las manifestaciones en la calle, realizando un llamado de atención para no caer en el espectáculo de la violencia que todo lo distorsiona y apaga:

“Manifestação é coisa anticatatônica, porque se faz com mãos e pés, com o confronto dos corpos num território concreto, sob a forma de um ‘nós’ inquietante, monstruoso, chamado multidão. Esta última é uma besta que dorme e, uma vez acordada, pode dar medo.

Por isso, há algum alento humano na redescoberta do poder das ruas, ainda que tudo isso possa ser efêmero. A revolta de maio de 1968 na França começou a acabar quando a ela se juntaram organizações políticas e quando as ações de rua passaram a visar mais a sua reprodução midiática do que a real contestação do poder. Ou seja, quando se converteram no espetáculo da violência” (Muniz Sodré, “O êxtase da conexão nas ruas”, Observatório da Imprensa, 25/06/13, n° 752).

Es extraordinario el número de MIE (medios de información espontáneos) que surgieron en Facebook. En general a partir de la movilización se creó conciencia e instantáneamente construyeron un perfil, otros ya existían y confluyeron a esta red social, por ejemplo Mães de Maio en FB, viene del Blog Movimento Mães de Maio vigente desde 2009 [no dia 13 de junho de 2012, há exato 1 ano, foi exumado o corpo do guerrêro Edson Rogério Silva dos Santos, no cemitério Areia Branca, em Santos (SP). Ele, que era gari e trabalhava naquele dia com atestado de licença médica, mesmo assim foi assassinado durante os Crimes de Maio de 2006, na Baixada Santista, por grupos de extermínio ligados direta ou indiretamente à Polícia Militar do Estado de São Paulo. Sua mãe, a guerreira Débora Maria da Silva, é uma das fundadoras e coordenadora do nosso movimento Mães de Maio. http://maesdemaio.blogspot.com.ar/].

Múltiples medios alternativos nacieron y/o se potenciaron (Jck Midia Independente – FrontLine, Coletivo Projetação) Cada ciudadano tiene la potencia de devenir MIE si posee DTCM (dispositivos tecnológicos de comunicación manuales y móviles) para transmitir instantáneamente los hechos. Cada persona en la calle se torna un MIE, productor de contenido. Sorteando los problemas de amateurs, en la calidad de la edición, oratoria, y composición de discurso, esto no impidió que se entienda lo que estaba sucediendo día a día. La repercusión aumentó por el clamor de las calles. Qué sucederá mañana no se sabe, por el momento están colocando en jaque a los medios tradicionales, especialmente a la Red Globo, que a su vez está siendo atacada en sus instalaciones por manifestantes.

La cuestión es construir un sistema acorde a lo que están exigiendo las multitudes. Como refiere Rociclei Silva “Não sabemos para onde estamos indo e o que o futuro nos reserva, mas sabemos que nunca mais seremos os mesmos e que produzimos uma outra realidade”( Rociclei Silva. Amanhã vai ser maior. A força de Jó nos levantes de junho. Pág. 85).

Una sociedad es la reunión de personas constituida para cumplir un fin mediante la mutua cooperación. Y no beneficios para un grupo hereditario, como lo explica Muniz Sodré:

“O que se pode chamar de sociedade de massa no Brasil recobre aproximadamente 20% da população que tem uma relação direta com o Produto Interno Bruto. Essa parcela, que detém o controle da riqueza privada nacional, caracteriza-se por um perfil econômico de excessiva concentração de renda e altíssima liquidez; um perfil social de grande homogeneidade étnica e mobilidade ascensional; e um perfil cultural centrado na busca de uma identidade civilizada através do acesso a saberes e a bens simbólicos do Primeiro Mundo” (Sodré Muniz. O social irradiado: violência urbana, neogrotesco e mídia. São Paulo: Ed, Cortez, 1992).

#NaoVaiTerCopa

El hashstag del subtítulo recorrió toda la red antes y durante la controvertida Copa del Mundo. Mientras tanto, la llamada izquierda olvidó que el fútbol es el opio de los pueblos como otrora lo es/fue la religión, en realidad la izquierda se olvidó que es izquierda.

El dinero recibido por un futbolista es pago por corporaciones, es decir que su propio juego está supeditado al capital. Su cuerpo incluso se convierte en marcas que auspician sus movimientos. El espectador ve un cuerpo-mercadería (Visa, Nike, Adidas, Oi etc.). Hasta acá no habría problema. Sí hay un problema moral cuando pensamos en la injusticia social y la miseria humana que esto conlleva, incluso porque esas mismas empresas son parte del capital financiero que determina en su viraje aleatorio quien pasa a ser indigente y quien millonario en segundos.

La Favela Moinho tiene casi treinta años de existencia, aunque llegó a albergar 5000 familias actualmente viven alrededor de 480 familias, una serie de incendios en el edificio del Moinho Matarazzo –en donde 1800 personas quedaron desamparadas redujo fuertemente el número.

En la antesala del inicio del mega evento, los pobladores de la favela, junto con el Comité de la Copa en São Paulo organizaron un evento deportivo alternativo: la Copa del Pueblo. Jóvenes asistieron y participaron en los partidos y en la organización. Es una jornada deportiva comprometida con la demanda de servicios básicos y que sostiene la pregunta de siempre: ¿por qué invertir billones de reales en el Mundial de Fútbol si varios sectores de la sociedad han demostrado que se puede jugar sin necesidad de despilfarrar tanto dinero, sobre todo cuando hay necesidades fundamentales que urge resolver?

Para los habitantes de Moinho está claro que “ese evento no es popular porque no se tiene tanto dinero para pagar boletos para los partidos y se reproduce, al mismo tiempo, el negocio capitalista que arruina los deportes, en cambio aquí, juega el que quiere jugar y a los partidos vienen los que tengan ganas. Es una verdadera Copa del pueblo” (Heriberto Paredes, Agencia Subversiones. Centro de medios independientes. http://cmiguate.org/copa-del-pueblo/).

Comunicación horizontal

Si creamos al mundo mientras este nos crea, hay que estar muy bien parados para no marearnos. La horizontalidad como está dada en la red es que todos podemos hablar y todos podemos ser escuchados, y en una red social también se manifiesta interactuando. La horizontalidad tiene sus reglas que hay que intuir o aprender en el camino porque no hay un manual, quizá debería haber interpretación y sensibilidad.

En este sentido, para ejemplificar la transformación del poder, recordemos uno de los orígenes de nuestra civilización en el momento de ruptura con el antiguo orden, y la re-existencia de uno nuevo junto a la apropiación horizontal del discurso.

Los griegos experimentaron una ruptura y una transformación radical de su sistema de pensamiento cuando, entre los siglos VIII y VII a/C se instituyó la polis en conformidad con el pensamiento lógico y el estado, para dejar atrás el pensamiento mítico asociado a la imagen de un poder de carácter divino y su universo de misterio. La invasión de los pueblos dóricos sobre el mundo micénico en el siglo XII destruye toda una forma de vida representada en el sistema palaciego. El bloqueo de la ruta de Oriente cierra la salida al mar, y Grecia se ve obligada a redefinir todo el sistema económico que pasa a una etapa agropecuaria. El desmoronamiento del sistema palaciego, cuya figura central era el “rey divino”, crea un enfrentamiento entre fuerzas de intereses opuestos, que en la búsqueda de un equilibrio en un período de desorden, nace una reflexión moral y especulaciones políticas que definirán una primera forma de sabiduría humana. “Los problemas del poder, de sus formas, de sus componentes, fueron repentinamente colocados en nuevos términos”(Jean-Pierre Vernant, As origens do pensamento grego. Ed. Difel, 1986, São Paulo. Traducción propia) [es interesante comparar este análisis con los acontecimientos actuales a partir del punto de vista de la crisis de un sistema de pensamiento y de la crisis de un sistema económico que llevó a la constitución del Estado y de la polis griega, orígenes de nuestra actual democracia].

La palabra escrita, que había desaparecido después de la invasión, es redescubierta por los griegos en el siglo IX, para integrar a la cultura a toda la comunidad. La palabra toma el poder y se torna la clave de toda autoridad en el Estado, es el medio de control y de dominio sobre los otros en la polis.

“La palabra no es más el término ritual, la fórmula justa, y si el debate contradictorio, la discusión, la argumentación (...); es esa elección puramente humana que mide la fuerza de persuasión respectiva de los dos discursos, asegurando la victoria de uno de los oradores sobre su adversario. (...) La cultura griega se constituye en un círculo siempre más amplio –finalmente al demos todo- el acceso al mundo espiritual, reservado en el inicio a una aristocracia de carácter guerrero y sacerdotal (...). Pero ese desarrollo provoca una profunda transformación: los conocimientos, los valores, las técnicas mentales son llevados a la plaza pública, sujetos a la crítica y a la controversia” [Jean-Pierre Vernant, “As origens do pensamento grego”.Ed. Difel, 1986, São Paulo.Traducción de la autora. Una transformación de la realidad se produjo en ese período de complejidad del pensamiento humano, que alberga los orígenes del pensamiento filosófico vigente hasta la actualidad (por ejemplo Tales de Mileto, Heráclito, Parménides,). Se pasa de una realidad sostenida por una visión mitológica, a una realidad sostenida por el pensamiento lógico-racional. El universo de la pólis se estructura bajo un estricto orden, comunicando a toda la comunidad la verdad, lo sagrado y el misterio, por medio de la palabra escrita].

Más tarde, en el siglo VI, aparece la isonomia, que significa la igual participación de los ciudadanos en el ejercicio del poder. En este contexto, la mesura es sinónimo de virtud, en consecuencia la hybris, el exceso, debe ser controlado. Las exaltaciones del prestigio, del poder de los individuos sobre la comunidad, “la ostentación de la riqueza, el lujo de las vestimentas, la suntuosidad en los funerales, las manifestaciones excesivas de dolor en caso de luto, un comportamiento demasiado audaz de la juventud noble, pasan a ser un exceso que debe ser controlado” (Jean-Pierre Vernant, As origens do pensamento grego, Pág. 47, Ed. Difel, 1986, São Paulo. Traducción propia) [una cuestión muy curiosa que plantea Vernant es que en Esparta, por haberse volcado a la guerra, el orden social está ligado al poder creador de cualquiera que sea excepcional. Por eso: “Elorden es lo primero en relación a la ley. El archépertenece en realidad exclusivamente a la ley. Todo individuo o toda facción que pretende asegurarse el monopolio del arché es una amenaza contra el equilibrio de las otras fuerzas, contra la homonimiadel cuerpo social, que pone en riesgo la existencia de la ciudad.” Jean-Pierre Vernant, “As origens do pensamento grego”. , Pág. 47, Ed. Difel, 1986, São Paulo.Traducción de la autora].Austeridad, ascetismo, moderación y reserva son requisitos para someterse a la Philia, al espíritu de la comunidad [las prácticas disciplinares de las que habla Foucault ya estaban presentes en el Hoplita: guerrero formado en una estricta disciplina para combatir en conjunto, marchar en orden, y no aventurarse a ser el héroe individual de los tiempos de la ciudad palacio. .” Jean-Pierre Vernant, “As origens do pensamento grego”. , Pág. 44, Ed. Difel, 1986, São Paulo.Traducción de la autora], que defendía los valores de la democracia, sustentados en una visión política de la realidad social [en verdad, aquel intento tan loable de construir una democracia, un sistema que contenga a todo el pueblo griego, fue una buena tentativa, pero nunca fue una verdadera democracia. La idea de comunidad quedó en los sueños, siempre hubo una verdad sobre los otros, proveniente de aquellos estratégicamente acomodados cerca de la ley y del poder].
El momento de ruptura que describimos que se produce en la civilización griega se asemeja al momento actual, por la complejidad que puede dar lugar a la ruptura y a la transformación del ser humano como ser político. Aunque esta comparación pueda parecer una visión arbitraria de la realidad actual, la elegimos porque nos coloca en el epicentro de la transformación.

Si la palabra es poder, la horizontalidad vendría a democratizar la sociedad. Entonces ¿por qué no liberar la Internet?, ¿Por qué no facilitar el ingreso y el acceso a la mayor parte de la humanidad? ¿O es otro anillo del simulacro?

Como referimos anteriormente, la figura y rol del líder está cuestionado, pero esto no es algo nuevo, parece que en los años ‘60 este proceso era llamado “trashing”:

“Qualquer pessoa que fosse escalada para ser líder, que assumisse posição de liderança ou aceitasse que a mídia o criasse como líder podia ser alvo. No movimento feminista americano, esse processo foi chamado de trashing. Quando uma mulher aceitava tal papel e se dizia líder do movimento feminista, outras de dentro do mesmo movimento a removiam da liderança, diziam não. Isso foi bastante forte nos EUA e não ocorreu apenas no movimento feminista. Agora, está muito difundido nos movimentos sociais, que não mais aceitam alguém que se posicione como líder” (revista Ecopós | ISSN 2175-8689 | comunicação e conflitos políticos | V. 17 | N. 1 | 2014 | entrevista com o filósofo americano Michael Hardt – Rachel Bertol | www.pos.eco.ufrj,br 6).

La construcción de un modelo político de convivencia pacífica es necesaria. La comunicación en red potencia la toma de consciência [toma de conciencia: acto por el cual la conciencia intelectual del sujeto se apodera de un dato de la experiencia o de su propio contenido. En un sentido político, consiste en el acto por el cual el individuo se da cuenta o comprende su situación real y concreta, estando en condiciones de sacar de ella las consecuencias y asumirlas. También puede haber una “toma de conciencia” colectiva] y la transformación. Los cambios no pueden esperar. ¿Será que estas huellas las está trillando los partidos Podemos en España y el partido Syriza en Grecia?

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María Isabel Ackerley tem mestrado e doutorado pela Escola de Comunicação da UFRJ e é pesquisadora no Departamento de Ciências Sociais da Universidade de Buenos Aires