outubro 25, 2015

Little Chandler, um dublinense, por Larissa Couto (Obvious)

PICICA: "Uma pequena análise para o conto "Uma Pequena Nuvem" de James Joyce, do livro "Dublinenses""

Little Chandler, um dublinense


Uma pequena análise para o conto "Uma Pequena Nuvem" de James Joyce, do livro "Dublinenses".

James Joyce, dublinense de nascimento e um dos maiores escritores do século XX escreveu alguns contos aos quais intitulou de "Dublinenses". Contos escritos em inglês e publicados em 1914, "Dublinenses" são quinze contos que enfocam diversos assuntos sobre Dublin e seus habitantes, suas vidas e escolhas, a infância e a morte, a religião e a paixão. O estilo de Joyce nesse livro de contos é o realismo neutro, já que tenta revelar os dublinenses por meio de um espelho bem polido sem linguagem emotiva ou tendências moralistas.

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O cotidiano do dublinense Little Chandler é pacato, até a chegada de seu velho amigo Gallaher, um dublinense que venceu na vida. Após oito anos sem ver esse amigo, Little Chandler repensou sua vida, aqueles oito anos. "E como sempre acontecia quando pensava na vida, ficou triste". Chandler era chamado de little por, apesar de ter uma estatura normal, "dava a impressão de ser um homem pequeno". O reencontro com Gallaher no bar lhe dava um novo frescor, lhe trazia de volta a vontade de escrever suas poesias, de ser artista, de ir embora de Dublin, de ser talentoso, receber boas críticas. Ele percebera que não era tão velho, tão temeroso, tão frágil, era preciso audácia, pensava ele, para vencer na vida. Gallaher poderia ajudá-lo, publicar um de seus poemas em um jornal londrino. Ele sabia que não seria popular, mas seria capaz de expressar sua melancolia em versos e conquistar um pequeno público, alguns críticos, ser um poeta.

Ao rever Gallaher, ao ouvir sobre seus oito anos fora, sua vida agitada, sua audácia, viu-se retornando à realidade, contou sobre sua vida, sua esposa, filho, viu sua natureza sensível ser abalada pelo contraste entre suas vidas. Little Chandler pensou na inferioridade do amigo em termos de nascimento e educação, mas ele sabia que seu impedimento era a "desafortunada timidez", o que seu amigo não possuía. Ele queria reafirmar sua virilidade, queria vingança. Chandler disse ao amigo que um dia "colocaria a cabeça no saco, como todo mundo", irá casar e ter filhos, se acomodará. Gallaher diz que o dia que casar não será por romantismo, mas por dinheiro, e que não tem pressa, Little Chandler apenas diz que o amigo ficará rançoso. 

Little Chandler em casa, uma criança nos braços, olhou os olhos de sua esposa na fotografia, olhos calmos, como o irritavam, sem paixão nem enlevo. Viu o ressentimento crescer dentro de si, tentou ler alguns versos, a criança acordou, chorou, os berros lhe feriam os tímpanos, a esposa entra em casa e pergunta o que aconteceu, ele apenas chora. Chandler envergonhado e com lágrimas de remorso se afasta. 

A vida que lhe parece vigorosa, na espreita por sua audácia, sua vontade, sua arte cresce a cada passo ao encontro com seu amigo. Força e timidez não combinam, ele pretende largar a segunda ao ir embora de Dublin, lugar onde nada acontece. Ele quer arte, poesia, quer viver de sua melancolia traduzida, vê no amigo a oportunidade. Com a mesma força que é arrebatado pela emoção do querer, abala suas esperanças na melancolia não tão artística de sua realidade confrontada com a de seu amigo. Vê como chegou até aquele ponto, foi por timidez, tristeza, fragilidade, sensibilidade, falta de virilidade. Tinha boa educação, mas faltava atrevimento, ousadia. Seu amigo era o que queria ser, mas percebeu que para ser assim, devia assumir o caráter cosmopolita de seu amigo, sua "imoralidade", seu pequeno talento, sua personalidade vivaz. Era muito a abdicar, transformar-se em tudo que quer e não pode ser, sua sensibilidade o fragilizava, sua melancolia o destruía a cada dia de tristeza e medo das vielas escuras que pensava vencer a passos largos. Não era poeta, não conseguia sequer ler poesia. Chandler estava amargurado e envergonhado, mas sua vontade não conseguia libertá-lo, ao contrário, aprisionava-o. O abatimento lhe enraivecia, queria paixão, queria escrever suas paixões, mas era muito para ele apaixonar-se, ele não entendia como vivia sem paixão, mas escolhia o caminho da normalidade, da moralidade, da vida ao oposto do que desejava, isso o abalava. Sua tristeza não era poética, era real, real demais para ser versificada. Ele queria sentir mas tinha medo. Queria sair de Dublin para ser ele mesmo, mas ser ele mesmo era o que já estava sendo, e não lhe agradava. Uma pequena nuvem não transforma o céu em tempestade. Como lê-se em Aristóteles, segundo o caráter, as pessoas são tais ou tais, mas é segundo as ações que são felizes ou o contrário (Arte Poética, 2005, p. 25).



Larissa Couto

Estudo para ser Filósofa, Leio para ser escritora e Penso para ser eu mesma - ou ao contrário. .

Fonte: Obvious

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