outubro 30, 2015

Ressonância (RAZÃO INADEQUADA)

PICICA: "O mais importante e bonito, do mundo, é isto: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas – mas que elas vão sempre mudando. Afinam ou desafinam, verdade maior” – Guimarães Rosa" 


Basta o encontro de duas vibrações semelhantes, ainda que ricas em diferenças, para haver ressonância. Uma na outra nota, um no outro som. Dois timbres se acrescentando entre si. Um cruzamento de interesses. Um se prolongando no outro. Se será um bom ou mau encontro, nunca se sabe. Flauta e Violino em comunhão? Transa de Voz e Violão? Pode ser intenso, é só uma questão de medida.

Para viver e filosofar é de bom tom saber um pouco de música. A ressonância é a capacidade de intensificar um movimento! É preciso estar à altura deste processo. Cada objeto tem uma frequência natural, duas ondas que sintonizam uma mesma frequência. A ponte que cai com a força do vento, o grito que destrói o vidro. Trezentas vibrações por segunda e Bum!, a matemática pode ser muito dura.
E é assim com os signos, eles também entram em ressonância. Pode ser construtivo ou destrutivo, depende do encontro, do ponto de vista. Cada coisa tem um ritmo, cada uma vibra em sua própria frequência. Temos que aprender a respirar, andar, cantar. Fazer com que os ritmos da matéria entrem em ressonância. Tudo é complicado, tudo está frequentemente implicado!
O mais importante e bonito, do mundo, é isto: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas – mas que elas vão sempre mudando. Afinam ou desafinam, verdade maior” – Guimarães Rosa
Na raiz da ressonância está o conflito, o choque, o encontrão. É o único jeito de descobrir que atravessar o outro pode ser atravessar a si. Bater de frente pode ser o melhor caminho para sair do lugar. Deixar o pensamento, o som, a onda seguir seu curso é ainda a melhor maneira de descobrir seus prolongamentos. O como amamos os prolongamentos! Na rua, as ideias se encontram, marcam de conversar, passam noites em marcha, enfrentam o cale-se e, no leve andar da multidão, se intensificam. Escolhem-se aos pares, trios, quartetos…..
POLLOCK, Deep, 1953
POLLOCK, Deep, 1953

Como na música, ressonância é também uma questão de altura. Graves baixos ou agudos clarins, pouco importa. Encontramo-nos às portas da diferença, e estamos ansiosos por abri-la. Ultrapassamos os limites e damos as mãos. Cruzamos as cercas, pulamos os muros, voamos pelas janelas. Tudo para encontrar e fazer encontrar. Soar e ressoar.  Quantos timbres, quantas durações, quantas intensidades, um mar de possibilidades.

Um desafio político: encontrar semelhança sem subjugar a diferença; uma postura ética: tornar melhores os bons encontros, fazê-los ressoar! Formar acordes de felicidade, acordar. Quão potente ou impotente pode ser uma ideia ressonante? Quando abrimos um livro de Espinosa, quando observamos um quadro de Pollock, quando ouvimos um improviso de Coltrane; somos atravessados! O corpo é um aglomerados de átomos que vibram. Sentimo-nos arremessados contra um amontoado de ideias em profusão, algumas delas nos fazem mover em velocidade infinita, que é isto senão ressonância? Aquela sensação de sentir-se contemplado em um  pensamento.

Uma boa ideia é inofensiva se não encontrar ressonância! É  triste encontrar ideias potentes com pouca amplitude. É mais triste ver ideias impotentes sendo veiculadas pelos ares, ressoando artificialmente dentro de nossas casas! (veja aqui). Assim, torna-se necessária uma sintonia, transmitir a própria estação, “torna-te quem tu és”, rejeitar as máquinas de ressonância, fabricar outras frequências, sintonizar outras ondas. É preciso habitar a superfície, afinal, é só pelo contato que nos fazemos ressoar.

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